sábado, 17 de julho de 2010

Casamento com imaturidade afetiva




1. Eduardo, quando conheceu Mônica, tinha apenas 18 anos de idade e ela, 14. Eram pessoas do grupo de jovens na comunidade onde residiam. Após algumas paqueras, iniciaram o seu namoro e envolveram-se numa apaixonante relação, que resultou em gravidez seis meses depois do primeiro olhar. Então, para não escandalizar os pais e a sociedade, aceleraram o processo em vista das núpcias. Casaram-se primeiramente no civil, devido a uma certa pressão sofrida dos pais e, cinco meses depois, contraíram matrimônio na Igreja, somente porque a Pastoral do Batismo exigiu deles o matrimônio para que pudessem batizar a filha na comunidade. Com um pouco de sacrifício, conseguiram levar adiante a vida conjugal por cerca de dois anos e, quando estava prestes a nascer a segunda filha, Mônica envolveu-se num relacionamento com um primo seu. Isso foi a gota d’água para que Eduardo tomasse consciência de que casou-se em modo imaturo, sem saber direito o que estava assumindo. Com o esfriamento na vida a dois, entre altos e baixos, não conseguiram permanecer no vínculo por seis anos. A iniciativa da separação foi dele. Não conseguindo reconciliar-se com ela, resolveu por bem apresentar o seu súplice libelo ao Tribunal da Igreja, na expectativa da nulidade de seu matrimônio com Mônica.
2. O Tribunal acolheu o seu pedido, invocando como possíveis causas de nulidade matrimonial a base dos seguinte capítulos:
1) Por grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e deveres matrimoniais por parte de ambos (can. 1095, 2°);
2) Por medo grave proveniente de causa externa, sofrido por ambos (can. 1103).
3. Mônica foi devidamente convocada para contestar a lide, porém, não compareceu, nem justificou o seu pleito. Convocada oficialmente para depor, também não compareceu. Por conseguinte, foi declarada ausente no processo.
4. As Testemunhas arroladas compareceram, lançando assim um facho de luz sobre a história apresentada no libelo. Resumidamente, alegaram no processo as seguintes afirmações:
“Os dois se relacionaram sexualmente, porque estavam cegos de paixão naquele momento. Descobriram que Mônica estava grávida e então, para não fazer feio diante da comunidade e da família, decidiu acelerar a data do casamento. Casaram-se primeiro no civil e, para poder batizar a filha, encaminharam tudo às pressas na Igreja. A festa foi fria, com apenas algumas pessoas convidas”(Tia de Mônica);
“Eduardo e Mônica casaram-se apenas para reparar um erro cometido, porque ambos tinham medo de seus pais. Mônica não foi uma boa esposa, pois não sabia fazer as coisas do lar e, logo depois, cometeu infidelidades com o seu primo, tendo com ele várias relações sexuais. Quando Eduardo veio a descobrir, separaram-se e não conseguiram viver mais debaixo do mesmo teto”(Mãe de Eduardo);
“O pai de Eduardo era muito severo, um tipo italiano, que dava as ordens e todos tinham que cumprir. Eduardo ficou com medo diante da gravidez inesperada. Além disso, ele era um tipo adolescentão, que continuava a sua vida de solteiro, fugindo à noite para beber com os amigos, farras, bailes. E Mônica, continuou como se fosse solteirona, vindo inclusive a cometer traições contra o seu marido. Teve várias relações sexuais com seu primo. Quando Eduardo descobriu, resolveu se separar dela”(Irmão de Mônica).
5. As demais Testemunhas confirmaram a versão dos fatos apresentados no processo.
6. Houve uma perícia sobre os autos do processo, que concluiu, dentre outras coisas, “que Eduardo não recebeu educação sexual e Mônica foi a sua primeira parceira sexual. Por ter engravidado Mônica, teve ele consciência do seu erro e manifestou fortes sentimentos de culpa. Recorreu ao casamento para reparar o erro. Mônica era sedutora, liberal, usava roupas provocantes e andava com muitas amigas de infância, mesmo depois de casada”(Dr. Perito).
7. O medo grave, apontado como possível capítulo de nulidade, deve ser uma causa externa, como condição sem a qual a pessoa teria não teria saída, a não ser o casamento. Os juízes concluíram que existiu uma certa influência da família, mas isso não ficou comprovado nos autos, que fosse provocado por uma causa externa. O verdadeiro motivo do fracasso desse matrimônio não está focado sobre o medo, mas sobre a imaturidade das partes.
8. As partes eram bastante jovens ao iniciarem o seu namoro e, cinco meses depois, tiveram que casar, por causa da gravidez de Mônica. Casaram-se primeiramente no civil e, por influência dos genitores de Eduardo, aceleram as coisas em vista do matrimônio na Igreja, sendo influenciados também pela equipe de preparação ao batismo, como se o matrimônio Igreja fosse exigência para batizar a filha na comunidade de fé. Tal influência não se caracteriza como medo referencial, porém, como interferência numa decisão que não estava madura naquele momento.
9. O casal poderia ter permanecido somente no vínculo civil. Porém, obnubilado pela imaturidade afetiva daquele momento, não tiveram outra saída, que o matrimônio na Igreja.
10. Depois do nascimento da primeira filha, Mônica passou a secundar o relacionamento amoroso com seu cônjuge, vindo a cometer infidelidades conjugais com outra pessoa. Isso não se caracteriza uma mentalidade de exclusão da fidelidade. Contudo, esta sua atitude revela o quanto ela foi imatura e continuou a sê-lo, depois das núpcias.
11. Na hora do consentimento matrimonial, as partes estavam ofuscadas pela onda da gravidez inesperada, a ponto de não perceber que tudo o que lhes era dito carecia de verdades. Isso revela a imaturidade afetiva dos dois, que poderiam muito ter insistido em dar um tempo a mais. Em resumo, não estavam em condições de proferir o consentimento em modo deliberado e definitivo. Casaram-se na Igreja como se fossem dois adolescentes, totalmente desprovidos de convicções sobre o que estavam assumindo.
12. Em base ao exposto, o Tribunal Eclesiástico declarou a nulidade desse matrimônio, sendo homologado em Segunda Instância, pela grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e deveres matrimoniais por parte de ambos (can. 1095, 2°).

Um comentário:

Anônimo disse...

Prezado Frei Ivo,

verdadeiramente estas questões de Tribunal Eclesiástico para anulação de matrimônio sempre parecem-me muito confusas.
No caso em questão, para mim, além dos depoimentos, seria indispensável e necessário prova material (fotografia inquestionável, escritos explícitos, outros documentos, filmagens...) de que a mulher em questão teve "inúmeras relações sexuais com seu primo" e a título de esclarecimento se este primo seria filho do tio, ou marido da prima, ou ambos, o que modifica um pouco a questão toda.
No entanto, imaturidade emocional apenas, não explica o comportamento, parece-me algo bem mais patológico.

Cordialmente.
Denise Pires.