sábado, 20 de agosto de 2011

A convalidação de um matrimônio com defeito


Jandira é batizada e crismada na Igreja católica. Há quinze anos, em sua juventude, encontrou o seu príncipe encantado, Samir, um muçulmano, com o qual contraiu núpcias numa mesquita. Hoje ela é católica praticante. Tem três filhos, todos batizados na Igreja católica. Samir é um bom pai de família. Na sexta-feira ele frequenta a mesquita e no domingo, vai com Jandira e os filhos para a comunidade católica. Ao ler uma matéria publicada em nossa Paróquia Virtual, Jandira apresentou a sua preocupação, tendo em mira saber se o seu matrimônio é valido na Igreja católica?
1. A questão em foco envolve diferenças culturais e também religiosas, um tanto complexas, uma vez que se trata de duas religiões bastante diferentes, apesar de serem monoteístas. Considerando, porém, que a convivência do casal é pacífica, com mútuo respeito e mútua tolerância religiosa, o enfoque que daremos a seguir, percorre os possíveis caminhos ou saídas dentro da Igreja católica. Para maiores detalhes sobre o casamento muçulmano, convidamos o internauta a visitar, dentre outros, o site: http://onossocasamento.pt/artigos/casamento-muculmano-e-suas-tradicoes, do qual copiamos também a sugestiva foto desta reportagem.

2. As normas da Igreja católica prevêem alguns remédios ou tentativas de ajudar os seus fiéis, quando ocorre uma situação como esta, aplicando a convalidação simples ou a sanatio in radice (sanação radical).

3. A convalidação simples (can. 1156-1160) é um recurso aplicado nos matrimônios que são nulos desde o início, resultantes de um impedimento dirimente, muitas vezes oculto, que cessou pela sua própria natureza. Exemplos: impedimento de idade (can. 1083) ou de impotência relativa ou duvidosa (can. 1084) ou de vínculo (can. 1085). Em cada caso, porém, exige como pressuposto que haja a aparência de matrimônio, ou seja, que na hora da sua celebração, não tenham faltado os requisitos mínimos da forma canônica, exigidos à sua validade. Em outras palavras, a convalidação simples acontece quando é possível a renovação do consentimento. Tal renovação pode ser unilateral ou bilateral. É unilateral, quando apenas uma parte renova o seu consentimento. É bilateral, quando ambas as partes proferem a renovação de seu consentimento.

4. A sanação radical é um recurso do direito, usado sobretudo para sanar ou remediar um matrimônio nulo, sem a necessária renovação do consentimento pelos contraentes. A sanação traz no bojo a dispensa de um impedimento, por exemplo, da disparidade de culto (can. 1086), aliado ao seu defeito de forma (can. 1108), como aconteceu no caso em epígrafe. É uma graça concedida pela autoridade competente da Igreja, que convalida o matrimônio desde a sua origem (can. 1161, § 2).

5. O impedimento de disparidade de culto (can. 1086) surge entre uma pessoa batizada na Igreja e outra pessoa não batizada, ou ainda, se o batismo do seu parceiro é duvidoso na Igreja. Exemplos disso podem ocorrer com pessoas católicas que queiram contrair matrimônio com pessoas de outras tradições religiosas, sejam elas não cristãs, ou cristãs de outra denominação não reconhecida pela Igreja católica. De acordo com os cânones 1125 e 1126, à semelhança dos matrimônios mistos, somente se concede a dispensa, se a parte não batizada assuma os seguintes compromissos:
1) Que não haja defecção da fé católica;
2) Que prometa que educará os filhos na fé católica.

6. O defeito de forma (can. 1108) acontece, quando as partes ou ao menos uma delas, estava sujeita às normas da Igreja católica. Um matrimônio, para ser válido na Igreja, deve ser celebrado diante do pároco ou de uma testemunha qualificada delegada por ele. O defeito de forma também pode ocorrer: se houve a ausência das testemunhas comuns do matrimônio (padrinhos); se o casamento foi celebrado apenas civilmente, ou ainda, se a parte católica não solicitou da autoridade da Igreja a dispensa desta forma, para que o matrimônio fosse celebrado em outra tradição religiosa (disparidade de culto ou mista religião).

5. É importante lembrar que não é a sanação radical que cria o vínculo matrimonial, mas o consentimento das partes. A sanação é um remédio para melhorar a sequência da vida matrimonial, de acordo com o consentimento já efetivado pelas partes desde as suas origens. Ex. se o casamento civil entre A e B aconteceu em 1990 e a sanação foi solicitada em 2011, tal matrimônio com esse recurso, é reconhecido como válido desde aquele ano e não somente na atualidade. Portanto, os efeitos da sanação são retroativos à data do consentimento proferido pelas partes, desde que o mesmo perdure (can. 1161, § 3). Nesta linha, não seria possível legitimar um casamento civil que se encontra em vias de separação ou de divórcio, mesmo que seja solicitada a sua sanação. Também não seria possível aplicar a sanação radical a um matrimônio nulo, desde o início, pelo impedimento de disparidade de culto ou pelo defeito de forma, se não houvesse a perseverança no seu consentimento.

6. E qual seria a diferença entre a convalidação simples e a sanação na raiz? Na convalidação simples, a renovação do consentimento, seja unilateral ou bilateral é feita mediante o pároco ou uma pessoa delegada por ele. A sanação na raiz, quando solicitada, acontece mediante um decreto do ordinário local (bispo), sem a necessidade da renovação do consentimento. Os efeitos da sanação não acontecem a partir do momento em que a mesma é concedida, mas a partir do consentimento dado pelas partes.

7. Configurando a parte jurídica ao caso apresentado, deduzimos que ele está em desacordo com as normas da Igreja desde a sua origem. Jandira, pelo fato de ser católica, deveria ter solicitado da Igreja a dispensa do impedimento da disparidade de culto e também a dispensa da forma canônica, para que ela pudesse contrair validade o seu matrimônio com Samir. Porém, se não o fez, agora é possível encontrar uma saída, através da sanação radical. Tal solicitação pode ser feita diretamente pelas partes interessadas ou por intermédio de outra pessoa. A autoridade competente da Igreja a conceder o decreto da sanação é a Sé Apostólica ou o bispo diocesano (can. 1165). Os casos mais comuns, como este, são de competência do bispo diocesano. Deste modo, a pessoa interessada em conseguir a graça da sanação, deve percorrer os seguintes passos:
1º) Procurar o pároco ou o seu assistente espiritual e narrar a sua história, em que manifeste os motivos da sanação;
2º) O pároco ou a pessoa delegada por ele, deve elaborar um breve histórico, constando os nomes dos cônjuges, o local e data de nascimento, a data do batismo da parte católica, a data do casamento civil, os motivos que norteiam a sua solicitação, e emitir um parecer pessoal sobre a perseverança do consentimento natural das partes;
3º) Se uma das partes não concordar no pedido na sanação, ele deve agir com prudência, porque pode estar comprometendo a seriedade de tal solicitação e de seus efeitos. Seria ideal consultar a outra parte, para comprovar que isso não seja motivo de desavença dos cônjuges;
4º) Anexar ao pedido o batistério recente da parte católica;
5º) Se o bispo desejar, que sejam ouvidas uma ou duas testemunhas, a respeito da perseverança do consentimento das partes.

8. O decreto da sanação é comunicado à paróquia onde as partes foram batizadas, para ser transcrito no livro de batismos. Os efeitos da sanação são os mesmos do matrimônio na Igreja. Isso significa que Jandira está livre para comungar na Igreja E se um dia Samir quiser passar para a Igreja católica, não será necessário um novo pedido de sanação ao bispo. Basta que ele seja batizado na Igreja, para ser incorporado na comunidade eclesial e, se for de seu interesse, para comungar na Igreja, que faça também a primeira Eucaristia. Assim, Jandira e Samir podem continuar com todos os elementos favoráveis, para que seu lar continue sendo uma Igreja doméstica, no cultivo dos valores essenciais da vida a dois e na educação dos frutos oriundos de tal consentimento sanado em sua raiz.

sábado, 13 de agosto de 2011

Matrimônio entre luteranos e católicos


Sou pároco numa cidade do interior do Rio Grande do Sul, onde muitas pessoas de confissão luterana casam-se com católicos e vice-versa. Diante disso, gostaria de saber sobre a validade do matrimônio na igreja luterana e se estes casamentos podem ser considerados válidos na igreja católica?

No entender das Igrejas da Reforma o matrimônio é um vínculo natural, indissolúvel por si mesmo. Tal vínculo surge do amor mútuo entre os nubentes, quando se sentem maduros para contrair núpcias, que por sua vez, exige dos cônjuges a mútua responsabilidade na edificação da família.

A Igreja Luterana aceita o sacramento do Batismo e a Ceia do Senhor. Porém, em relação ao sacramento do matrimônio, basta que o vínculo produza o seu caráter permanente e responsável na vida a dois, podendo ou não ser ratificado pelo Estado e ou abençoado pela Igreja. Porém, quando a bênção é solicitada, deveria ser pra valer, uma vez que é um testemunho público de fé das partes. “Ainda que não seja um sacramento, a benção matrimonial é testemunho público de fé. O casal pede a bênção de Deus para o compromisso de levarem uma vida conjugal em fé, amor, respeito, fidelidade, em conformidade com a vontade de Deus. Deus abençoa com seu "sim" a união e faz-se companheiro na caminhada do casal. A Igreja Evangélica de Confissão Luterana realiza a bênção matrimonial de casais que já estejam - ou são simultameamente - habilitados pela lei civil. Ambos, ou um deles, devem ser membros de uma comunidade luterana e ambos devem ter feito o curso pré-matrimonial” (www.luteranos.com.br/sacramentos/matrimonial).

Diante disso, conclui-se que na compreensão da Igreja Luterana o casamento não é um sacramento, como na Igreja Católica e nas Igrejas Ortodoxas. Contudo, se o vínculo perdura, criando a tão almejada harmonia dos cônjuges, que é robustecido pela bênção da Igreja Luterana, continua sendo válido, fecundado pela graça do Senhor.

Na Igreja Católica, as suas normas são bastante claras, ao afirmar que o "pacto matrimonial, pela qual o homem e mulher constituem entre si o consórcio de toda a vida, por sua índole natural ordenado ao bem dos cônjuges e à geração e educação da prole, entre batizados foi por Cristo Senhor elevado à dignidade de sacramento" (cânon 1055, § 1). E no segundo parágrafo do Código da Igreja, fica claro que "entre batizados não pode haver contrato matrimonial válido que não seja por isso mesmo sacramento" (cânon 1055, § 2).

Diante da questão exposta, podemos conjecturar várias hipóteses de aceitação pelas Igrejas, sejam elas Luterana ou Católica, sobretudo em vista das relações ecumênicas que norteiam as comunidades eclesiais de muitos rincões brasileiros:

1) Os pastores da Igreja Luterana dão a bênção a um casamento ecumênico, realizado entre nubentes de confissões luterana e católica, quando a mesma é solicitada pelos mesmos. Porém, a condição colocada é que haja a plena comunhão de vida e, na educação dos filhos, que os cônjuges encontrem uma maneira autêntica de viver sua fé cristã em seu meio ambiente, no convívio do dia-a-dia, aceitando e levando a sério a fé o modo de crer do outro;

2) Os párocos católicos aceitam a celebração de matrimônios mistos (com a licença do bispo), entre católicos e luteranos (ou outra religião cristã), desde que haja uma fundada esperança que os cônjuges respeitem mutuamente as confissões assumidas e que a educação dos filhos seja na Igreja Católica;

3) Considerando que a base fundamental da vocação cristã esteve plantada no batismo cristão, tanto na primeira hipótese, quanto na segunda, se houver o fracasso de um desses casamentos, uma vez que foi válido, não pode ser desfeito o vínculo, salvo restando na Igreja Católica o caso seja apresentado no Tribunal Eclesiástico.

Portanto, se o vínculo perdurar, o matrimônio continua válido em ambas as religiões, o que significa que não há necessidade de nova celebração. E se o vínculo fracassou e a parte católica queira contrair novas núpcias na Igreja Católica, que apresente o seu caso ao Tribunal Eclesiástico. Se o interesse for por outro cônjuge luterano, que seja levado o caso ao pastor da Igreja Luterana, para ser apreciado pela devida Igreja. Lá, como não é considerado sacramento, haveria possibilidade de receber uma nova bênção, depois de avaliado o caso pelo seu pastor.

domingo, 7 de agosto de 2011

O Casamento de Hebreus com Gentios

Olá Charles! A pergunta é interessante e nos ajuda a entender o pensamento dos judeus e o porquê que são tão radicais nos seus pressupostos religiosos.

Este tema que se refere ao casamento dos judeus com estrangeiros é preocupante e apresenta dificuldades na compreensão da vida judaica. Este tema entra na questão dos chamados casamentos mistos.

Os pais judeus se preocupam quando um filho se casa com alguém não-judeu, a cadeia milenar de continuidade judaica é rompida. Os pais de todas as formas impedem que isso aconteça. Mas também os pais sabem que opor-se abertamente ao casamento misto os expõem na controvérsia de conotações racistas, entram em uma questão muito delicada e que eles combatem ferozmente.

Por que não aceitar como parceiro de casamento se ele ou ela não nasceram de um mãe judia? Esta parece ser uma atitude discriminatória, que esta muito viva no judaísmo.

A Base Bíblica que responde a pergunta.

O texto básico que narra a proibição de um judeu casar-se com não-judeu encontra-se no livro do Deuteronômio em 7,3-4: “não contrairás com elas matrimônios; não darás tuas filhas a seus filhos, e não tomarás suas filhas para teus filhos”; o motivo para essa proibição encontramos no versículo a seguir: “ pois fariam teus filhos desviarem-se de mim, para servirem a outros deuses; e a ira do Senhor se acenderia contra vós, e depressa vos consumiria” Dt 7,4

O Rabino Rashi em seu comentário do Talmud (Yevamot 23 ) interpreta o versículo acima mencionado (ele e não ela afastará teu filho) como dois pensamentos interpretativos. No caso de sua filha casar-se com "o filho deles", ele terminará por afastar seus filhos (em outras palavras, seus netos, que ainda serão considerados seus filhos) do caminho da Torá e da observância da Lei. No caso de seu filho casar-se com a filha deles, os filhos não serão mais considerados seus filhos, mas filhos dela. Não são considerados judeus. Sabemos que no judaísmo a pertença ao povo judaico vem pela linhagem judaica da mãe. É uma ligação de sangue direta. Assim entendemos: Se o seu filho desposar uma mulher não-judia, os filhos nascidos dessa união não serão mais considerados seus filhos, não serão considerados judeus, a mãe pertence à outra raça, outro sangue. No caso de sua filha casar-se com um não-judeu, os netos poderão se desviar do caminho de Judaísmo, embora ainda sejam considerados judeus.

Como sabemos que todo judeu tem de cumprir os preceitos da Torá, é claro para os judeus desejam casar-se dentro da fé judaica, caso contrário, seria impossível continuar a cumprir os preceitos da Lei e a pertença ao Povo de Deus. O casamento com um gentio é contradição à vontade declarada de Deus em sua lei.

Concluindo:
Não somente é proibido para um judeu casar-se com uma mulher gentia, mas é contraditório para um judeu desposar uma não-judia. Poderão ate viverem juntos, a procriarem, mas não há possibilidade de ocorrer o casamento entre alguém pertencente ao judaísmo com um gentio.

As leis da Torá são objetivas e inalteráveis (ou mais) que as leis da natureza. Assim como não podemos simplesmente alterar a lei da gravidade, por exemplo, não podemos alterar as leis divinas contidas na Torá. O estudante da Torá não estuda para criar leis, mas para que com seu estudo da palavra divina possa descobrir a estrutura Divina que é sustentadora do universo e da vida do gênero humano.

Fonte: http://www.abiblia.org