domingo, 5 de dezembro de 2010

Incardinação e clérigos vagantes


Frei Tibúrcio é sacerdote, religioso, adscrito num instituto de vida consagrada clerical de direito pontifício. Estando em crise, resolveu pedir licença ao seu ordinário (superior) para morar um ano fora. Recebeu esta licença em 2005 e foi aceito para um tempo de experiência na diocese A. Descontente com o clero local e o bispo, sai daquela diocese e entra em 2006 na diocese B. Lá permanece por dois anos, mas na medida em que recebe a transferência para outra paróquia, discorda do bispo e pede para sair. Em meados de 2009, foi aceito na diocese C, mas o bispo está de olho nele, pelo fato de mudar muito de diocese a diocese. Sabendo disso, o seu ordinário de origem (superior religioso) escreve para ele, admoestando-o, tendo em vista a sua continuidade no instituto religioso ou numa diocese. Contudo, surge-lhe a dúvida, se ele poderia ser incardinado numa diocese e qual é o tempo mínimo de experiência?

1. A palavra incardinação vem do latim, cardo, que significa a extremidade pela qual uma ponta de um objeto se encaixa no seu eixo central e da sua dependência para poder girar livremente. Também expressa a avenida principal (cardo maximo), sendo cortada pelas ruas menores (decumanas), como era muito comum nas cidades construídas no império romano.

2. A Igreja herdou esta palavra do vocabulário comum, para expressar a estrutura central que um clérigo depende para bem desempenhar o seu ministério. Deste modo, a incardinação é a inscrição de um fiel de sexo masculino no clero de determinada Igreja particular (diocese), ou numa Prelazia pessoal ou num Instituto Religioso clerical, ou numa Sociedade que tenha faculdade de proceder à incardinação (can. 265-266). A incardinação originária se efetua pela recepção da ordem do Diaconato, ou no caso de um religioso consagrado, pela sua profissão perpétua no instituto. Uma ulterior incardinação em outra circunscrição, somente é possível mediante a excardinação da entidade anterior.

3. A incardinação numa diocese, prelazia ou instituto religioso produz o sentido de pertença àquela porção do povo de Deus. Para tanto, nenhum ordinário local (bispo) ou ordinário religioso (superior) pode proceder a outra incardinação, se o clérigo continua incardinado em sua circunscrição de origem (can. 267, § 1). Assim como não é possível, de acordo com a normativa da Igreja, um homem casar com duas mulheres e vice-versa, a não ser que o matrimônio anterior seja declarado inválido, não existe na estrutura da Igreja a possibilidade de duas incardinações ao mesmo tempo. Enquanto o clérigo não obtiver do seu bispo, prelado, ou superior a excardinação, não pode ao mesmo tempo estar incardinado em outra entidade (can. 267, § 2).

4. O prazo mínimo exigido pelo direito, como tempo de adaptação e conhecimento da nova entidade, é de cinco anos (can. 268, § 1). Porém, devem ser considerados os seguintes requisitos:
1) Que o clérigo manifeste por escrito, externando sua vontade de se incardinar na nova entidade, colocando os devidos motivos e que não regressará à sua entidade de origem;
2) Que tenha permanecido ao menos por cinco anos ininterruptos na nova entidade, sendo aceito pelo novo ordinário;
3) Que haja consenso entre os dois ordinários. Tal consenso pode ser dado no início, no meio ou no fim do quinquênio;
4) Que a residência na nova entidade não tenha sido interrompida ao menos por cinco anos, salvo restando se foi autorizada pelo ordinário que o acolhe por um justo motivo (estudos, enfermidade, férias);
5) Que nenhum ordinário tenha se manifestado contrário, por escrito, no prazo de quatro meses a partir da petição do clérigo.

5. No caso de um clérigo pertencente a um instituto de vida consagrada ou sociedade de vida apostólica, não se concede o indulto, se antes primeiro não tiver um bispo que o incardine na diocese, ao menos que o receba por um tempo de experiência. Se o tempo de experiência se prolongar por cinco anos e o religioso não for recusado pelo bispo, fica pelo próprio direito incardinado na diocese (can. 693).

6. Algumas ponderações a guisa de conclusão:
1) Receber a permissão do superior ou do bispo para fazer uma experiência numa nova diocese é uma graça, considerando, sobretudo, que a Igreja está aberta aos anseios dos clérigos, mesmo que tenham tido um razoável tempo de conhecimento na entidade de origem durante os longos anos de propedêutico, filosofia e teologia;
2) É muito comum acontecer nos dias atuais, a falta de comunicação entre os superiores e bispos, no tocante ao tempo de experiência. Além do mais, soe ocorrer acolhidas em dioceses, pela escassez de clérigos, sem que necessariamente isso se configure numa autorizada passagem. No meu modo de entender, deveria haver sempre uma consulta ao ordinário anterior, evitando-se assim posteriores dissabores;
3) Muitos clérigos demonstram instabilidade, transitando de diocese a diocese, na busca de um espaço para a sua realização pessoal e ministério ao povo de Deus. Mesmo havendo compreensão diante do lado humano do clérigo, quando isso ocorre muitas vezes, se deveria lançar uma interrogação se o problema não é mais pessoal do que institucional. E quando isso cria habitualidade, dificilmente o clérigo encontra o seu espaço ideal, o que resulta muitas vezes no retorno à entidade de origem;
4) Se acaso não se encontrar um bispo que acolha o clérigo, não se pode em hipótese alguma admitir a saída da entidade de origem, uma vez que no cenário da Igreja não pode haver clérigo acéfalo ou vagante (can. 265);
5) O clérigo que sai da entidade de origem não tem direito a ressarcimento ou remuneração pelo tempo de serviço prestado, independente de ser religioso ou secular. Aqui, pode-se aplicar uma dose de caridade fraterna. Contudo, isso não significa pagamento, uma vez que o que norteia o seu verdadeiro interesse não é o indulto de saída da entidade, mas o tempo de experiência e a possível incardinação na nova entidade.

7. Em base ao caso em epígrafe, respondemos que não basta o tempo que se vive fora da entidade A, B ou C, se em cada uma delas a experiência não se prolongar ao menos por cinco anos. Pode ocorrer ainda que após vários períodos curtos, vividos pelo clérigo numa entidade ou outra, resulte em uma ou duas admoestações do superior ao clérigo, para que ele volte à entidade de origem. Se o clérigo não concordar, se pode proceder ao processo de demissão, sobretudo se for religioso, de acordo com a normativa dos cânones 696 a 698.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Unção dos enfermos a cristãos não católicos


Uma pessoa liga ao nosso Convento e pergunta se poderia trazer para a celebração comunitária da Unção dos Enfermos uma pessoa de outra religião. Explica ele que esta pessoa é muito boa, correta, praticante em sua Igreja e que gostaria imensamente de ser ungida, uma vez que isso é muito bonito na Igreja católica. Diante disso, surge-lhe a dúvida, se o sacramento poderia ser ministrado a cristãos não católicos.

1. Princípios teológicos

Desde o início da história da salvação, a enfermidade é inimiga do ser humano, porque quebra a sua harmonia interior, ameaça a vida, rompe com a fluência de suas energias positivas, além de abafar a sua dignidade e auto-estima. É um mal físico e moral, que por mais que se lute contra ele, muitas vezes a solução é padecer pacificamente. Um exemplo típico na Sagrada Escritura foi o de Jó, que lutou ardentemente para se libertar da enfermidade e das correntes que o amarravam ao sofrimento. Porém, no meio das tribulações, Jó supera suas crises e é considerado um herói diante de Deus e da humanidade.
O Papa João Paulo II exorta os doentes a aceitarem esse estado, conformando suas vidas a Cristo sofredor e contribuindo, desse modo, para a santidade da Igreja (Cf. PAPA JOÃO PAULO II, Exort. Ap.: Salvifici doloris, de 11 de fevereiro de 1984). Por outro lado, a Igreja intercede pelos doentes, pela conversão de seus pecados e a restituição da saúde para que eles possam reintegrar a comunhão fraterna espiritual e corporal dentro da comunidade. Nessa perspectiva, não há mais espaço na nova visão da Igreja para se falar de extrema unção, ou última unção, como se fosse o passaporte para a eternidade, mas de unção dos enfermos, para que lhes seja restituída a vida.
O Vaticano II tenta recuperar essa dimensão, quando afirma:
“Pela sagrada unção dos enfermos pela oração dos presbíteros, toda a Igreja recomenda os doentes ao Senhor, que sofreu e foi glorificado, para que os salve e reanime (cf. Tg 5,14-16) e sobretudo os exorta a se unirem de coração à paixão e morte de Cristo (cf. Rm 8,17; Cl 1,24; 2Tm 2,11-12; 1Pd 4,13), para o bem do povo de Deus”(SC 73).
O Código de Direito Canônico incorporou essa visão teológica, afirmando que “a Igreja recomenda ao Senhor sofredor e glorificado os fiéis gravemente doentes, para que os alivie e salve”(can. 998).

2. Matéria, forma e ministro do sacramento

A matéria é o “óleo de oliveira ou de outras plantas esmagadas”(can. 847, § 1). Esse óleo deve ser bento na celebração própria para isso pelo bispo (Quinta-feira Santa) ou em caso de necessidade e dentro da própria celebração, por qualquer presbítero (can. 999, 2º). A unção é feita na fronte e nas mãos do enfermo. Por um justo motivo pelo perigo de contágio de uma doença, se pode usar de um instrumento, como é o caso do algodão (can. 1000, § 2).
A forma, são as palavras do sacerdote, de acordo com a tradução oficial do ritual no Brasil:
“Por esta santa unção e pela sua piíssima misericórdia, o Senhor venha em teu auxílio com a graça do Espírito Santo (R. Amém). Para que, liberto dos teus pecados, ele te salve e, na sua bondade, alivie os teus sofrimentos. (R. Amém)”.
O ministro da unção válida é “todo sacerdote, e somente ele”(can. 1003, § 1).

3. Condições para alguém receber a Unção

1) Que seja uma pessoa batizada;
2) Que tenha atingido o uso da razão (tenha ao menos sete anos de idade). A unção de dementes, somente seja ministrada, se manifestarem a capacidade de raciocinar e querer livremente. Em caso de dúvida, administra-se o sacramento (can. 1005);
3) Que possua a devida intenção, ao menos implicitamente e inclua a vontade de viver de acordo com os princípios cristãos, ou em iminente perigo, que o solicite;
4) Que comece a estar em perigo de morte por doença ou por velhice. Embora o sacramento não é para moribundos, se aconselha essa praxe. Também pode ser ministrado antes de uma operação cirúrgica de risco;
5) Que não persevere em pecado grave ou manifesto (can. 1007). Isso é somente para a liceidade. Não é prudente instigar a pessoa ao arrependimento de seus pecados, sobretudo quando está prestes a passar para a outra vida.
A Unção dos enfermos pode reiterada, sempre o doente, uma vez convalescido, recaia na enfermidade grave ou se a enfermidade for permanente. Pastoralmente, se recomenda a repetição desse sacramento, que funciona como elixir para aliviar as tensões do enfermo.
Por outro lado, se recomenda que a Unção seja unida aos outros sacramentos, na seguinte seqüência: 1) Penitência; 2) Unção; 3) Eucaristia.
A celebração pode ser comunitária ou individual, de acordo com as circunstâncias. A celebração comunitária da Unção dos enfermos serve de incentivo e encorajamento aos que se encontram no martírio de uma doença, para que sejam fortalecidos e elevem a sua auto-estima dentro da comunidade.

4. Uma possível resposta ao fato

No Direito Canônico da Igreja católica, existe uma saída, se o caso em epígrafe for configurado à normativa do cânon 844. De acordo com tal norma, é permitida a administração dos sacramentos da eucaristia, penitência e unção dos enfermos, aos fiéis das Igrejas Orientais separadas e outras Igrejas equiparadas pela Sé Apostólica, desde que obedeçam as seguintes condições:
1) Haja solicitação espontânea;
2) Tenham a devida disposição para recebê-los;
3) Evitem o proselitismo.
Aos fiéis de outras denominações cristãs, é permitida a administração desses sacramentos, sob as seguintes condições:
1) Em perigo de morte;
2) Em caso de verdadeira necessidade, conforme o parecer do Bispo diocesano ou da Conferência Episcopal. Neste caso, as condições expressas no cânon 844, § 4, exigem que esses fiéis manifestem diante do sacramento a mesma fé católica e que estejam devidamente dispostos a recebê-los. Em outras palavras, podem ser batizados, receber a ceia, mas lhes falta neste momento a devida consciência cristã, equiparada à fé católica, justamente porque nestas denominações não existe o sacramento da unção dos enfermos.
Diante do exposto, não nos parece que a pessoa que está demandando o sacramento seja norteada pelas verdadeiras condições acima. Tudo indica que ela esteja norteada pela moda que existe em nossa sociedade de receber bênção e unção de qualquer jeito, como se os sacerdotes e pastores e pastoras fossem dispensadores de graças divinas, sem se questionar sobre a verdadeira intenção e preparação para receber o devido sacramento. O questionamento aqui vale também para uma grande maioria de católicos romanos, que também frequentam outras denominações cristãs, como se fosse um mercado de graças, bênçãos e unções. Portanto, sem saber o verdadeiro motivo para receber a unção na celebração comunitária, a Igreja católica não se sente autorizada a dispensar a tal sacramento a fiéis de outras denominações, salvo restando se preencherem as condições supramencionadas.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Matrimônio contraído com epilepsia


1. Saturnino (Demandante) sofria de crises epiléticas desde a sua infância. Quando iniciou o seu namoro com Geovanna (Demandada), conversou com ela sobre isso. Apesar de algumas discussões e desavenças, namoraram por um ano e se decidiram pelas núpcias. Durante o tempo do namoro, os pais da Demandada quando souberam da epilepsia, insistiram que ela não se casasse o Demandante. Aconselharam que vendesse tudo o que estava preparado num brechó e desistisse do enlace. Mesmo assim, ela pretendeu as núpcias, porque não via em sua suposta doença um problema para a vida a dois. Depois de casados, com o advento de duas filhas, as crises se acentuaram, onde a Demandada passou a culpar o Demandante, afirmando que ele não apresentava condições de cuidar e de sustentar a família. O Demandante aplicou o dinheiro auferido em seu emprego para uma poupança, tendo em vista uma vida bem sucedida para suas filhas. Contudo, a Demandada armou uma trama com suas duas filhas e resolveu abandonar o seu esposo. Não lhe permitiu nem mesmo olhar mais para a prole. Entre altos e baixos, esta união conjugal perdurou vinte anos. Não sendo possível a reconciliação, separaram-se definitivamente.
2. Ao apresentar o seu súplice libelo ao Tribunal, o Presidente de turno fixou a fórmula de dúvidas, invocando os seguintes capítulos em vista do fim colimado:
1) Por grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e obrigações essenciais do matrimônio, que se devem mutuamente dar e receber, por parte do Demandante (can. 1095, 2°), ou;
2) Por incapacidade de assumir as obrigações essenciais do matrimônio, por causas de natureza psíquica, por parte do Demandante (can. 1095, 3°).
3. O Demandante confirma a versão do libelo em seu depoimento, deixando mais claro que queria se casar com ela e que ela sabia de sua epilepsia.
4. A Demandada não comparece para contestar a lide, nem para depor. Não justifica o seu pleito na ação em epígrafe, sendo declarado ausente no processo.
5. Todas as cinco Testemunhas arroladas foram muito claras, ao afirmarem que a epilepsia não foi a causa da falência deste matrimônio, porque a Demandada sabia disso desde o início. As crises eram controladas pelos medicamentos, ingeridos regularmente. O Demandante se manteve firme no trabalho, ajudando no sustento do lar. Porém, a Demandada, influenciada pela família desde o tempo do namoro, não fez nada para salvar o vínculo. Expulsou o esposo de sua residência, impedindo inclusive que ele pudesse visitar suas filhas.
6. No parecer da Juíza instrutora do processo, ela alega que “pelo testemunho de parentes e amigos, a doença não era motivo para que emitisse um verdadeiro consentimento matrimonial, porque ingeria remédios que controlavam o seu problema... Nas entrelinhas dos depoimentos, que vale a pena dizer serem sinceros e verazes, apesar de humildes, me pareceu que o desejo dela seria ter filhos... Após o matrimônio, o Demandante, dentro de suas possibilidades, ajudava no sustento do lar, mas a família dela começou a imiscuir-se na vida do casal e apesar das reclamações do Demandante, a Demandada nada fez para que isso não continuasse acontecendo, pelo contrário, concordava com tudo, ajudando-os até a separar o Demandante e sua família do convívio paterno e social com as filhas”(fl. 76).
7. O Defensor do vínculo, em suas considerações finais, reporta-se a um estudo de García Faílde, onde diz que “a Epilepsia não é uma enfermidade psiquiátrica, mas sim neurológica; em geral os epiléticos não apresentam transtornos psicológicos ou psicopatológicos, porém uma quarta dos epiléticos apresenta transtornos desta classe em que prevalecem a depressão, a ansiedade e isto vem acontecer após muitos anos de crises não controladas e a maior parte destes casos vão se dar em pacientes afetados de epilepsia do lóbulo temporal [que é uma das divisões do hemisfério cerebral]”(García F. F. Faílde, Epilepsia, in: Nuevo Estúdio sobre trastornos psíquicos y nulidad del matrimónio, Salamanca, Publicaciones Universidad de Salamanca, 2003, p. 181, cf. fl. 102). E continua o Defensor, concluindo que “não se encontram no processo descrições de violência, instabilidade de humor, atitudes agressivas do Demandante, que ao contrário, apesar de seu mal, é descrito como pessoa dócil e paciente, fato que os 20 anos de vida comum bem servem para comprovar que nele não havia qualquer incapacidade para receber e dar cumprimento às obrigações essenciais do matrimônio”(fl. 103).
8. Lamentamos, profundamente, que este enlace tenha se afundado nas areias movediças de uma fracassada colaboração da esposa e filhas em querer salvar a vida sacramental, que durou vinte anos de união conjugal. Por outro lado, gostaríamos de aplicar uma dose de misericórdia evangélica ao fato, na tentativa de encontrar um motivo para declarar nulo este matrimônio, deixando assim espaço para que as partes pudessem contrair novas núpcias na Igreja. Contudo, as normas da Igreja são muito claras em afirmar que enquanto não se prova em contrário, o matrimônio goza o favor do direito (can. 1060). Em base a isso, os três juízes do Tribunal Eclesiástico resolveram por bem julgar como válido o matrimônio em tela, porque o presente processo carece de provas contundentes.

sábado, 9 de outubro de 2010

Um matrimônio simulado


1. Genoveva e Expedito se conheceram e ao irem juntos no cinema, ficaram juntos já na primeira noite. Expedito (Demandado) namorava outra pessoa naquele momento. Mesmo assim, Genoveva (Demandante) o esperou. Quando chegou o momento oportuno, iniciaram o seu namoro. Dois meses depois já estavam se relacionando sexualmente. Faziam planos de se casar, mas a Demandante sempre apresentava dúvidas, se isso daria certo. Durante o tempo de namoro e noivado, que durou dois anos, tiveram muitas discussões e desavenças. O pai da Demandante era católico tradicional, muito rigoroso, o que contribuiu para influenciá-la, para que se casasse com o Demandado. Ela não queria o matrimônio para aquele momento. Chegou a afirmar que foi o dia mais triste de sua vida. Contudo, como o pai estava enfermo, resolveu por bem dar o seu sim, eivado de sentimentos simulatórios. Durante os sete dias da lua de mel não conseguiram consumar devidamente o matrimônio. Entre altos e baixos, viveram juntos apenas por 36 dias. Não havendo possibilidade de reconciliação, separaram-se definitivamente. Mais tarde, Genoveva, namorando um outro homem, que é a pessoa de seus sonhos e na expectativa de poder comungar na Igreja, entra no Tribunal da Igreja com o seu súplice libelo, tendo em vista a nulidade de seu matrimônio com Expedito.
2. O Tribunal Eclesiástico acolheu o seu pedido, tendo como base os seguintes capítulos:
1)Por defeito de consentimento, por grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e deveres essenciais do matrimônio, por parte de ambos (can. 1095, 2°);
2)Por simulação total do matrimônio, por parte da Demandante (can. 1101, § 2).

1. Fundamentação jurídica

3. O capítulo da grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e obrigações essenciais do matrimônio (Can. 1095, 2º) considera, antes de tudo, que a pessoa humana, ao assumir um compromisso de tal envergadura, como é o caso do matrimônio, deveria ter presente a sua decisão qualificada e as suas conseqüências:
“Por ser el matrimonio un consorcio de toda la vida, la persona que lo contrae se compromete prácticamente en todos los planos de su personalidad, de futuro y de forma permanente; por lo que su decisión total y radical, que transforma su vida y compromete su futuro, ha de ser una decisión cualificada. Exige, pues, el matrimonio un grado de conocimiento, de voluntad y libertad superiores a los que se exige para otros actos de la vida humana, es decir, una aptitud psicológica proporcionada a la naturaleza y trascendencia del mismo. Para la existencia de la discreción de juicio non basta lo que se llama conocimiento especulativo y teórico de lo que es el matrimonio, sino que se exige lo que se llama facultad crítica, aunque tampoco se exige una discreción máxima, es decir, una ponderación de todo el valor ético, religioso, social, jurídico y económico del matrimonio”(c. ALFAGEME SÁNCHEZ, Tribunal del Obispado de Zamora, 2 mayo 1996, in: Decisiones y sentencias de Tribunales Eclesiásticos españoles sobre el can. 1095, 2° e 3° (II), Salamanca, 1999, p. 66).
A discrição do juízo compreende as faculdades intelectivas que possibilitem ao sujeito, emitir o seu consentimento. Esse ato, sendo livre e consciente, sobretudo em base à experiência vital, deve levar em conta a natureza do matrimônio e de suas inerentes exigências. Por conseqüência, não é um juízo abstrato, mas embasado numa situação concreta de sua vida, onde ele possa deliberar, emitir um juízo e, por conseguinte, escolher. Depois de tudo ponderado, se isso for claro e distinto em sua decisão, então poderá assumir o matrimônio com as suas obrigações e finalidades que lhe são inerentes (cf. c. BURKE, sentença, 07/11/91, in: SRRD, vol. LXXXIII, p. 708).
Diante disso, podemos afirmar que não é o grau superior de estudos que a pessoa possui, mas a faculdade crítica que a capacita a emitir um ponderado juízo no momento decisivo do casamento, bem como sobre as futuras consequencias do enlace assumido perante Deus e a comunidade.
4. A simulação do consentimento, de acordo com o cânon 1101, § 2, é um ato deliberado da vontade, quando o consentimento é feito com fingimento, ou seja, quando a vontade interior da pessoa não corresponde às palavras pronunciadas por ela. Nesse caso, o consentimento é viciado e rende inválido o matrimônio. Juridicamente, se presume que as palavras pronunciadas sejam em conformidade com a vontade deliberada da pessoa. Por isso, toda e qualquer deformação deve ser provada. Até que não apareçam provas em contrário, o matrimônio goza do seu direito em si mesmo (favor iuris). Papel importante nesse tocante exercem as testemunhas, com o seu parecer a favor ou contra a nulidade de tal matrimônio.
A simulação pode ser parcial ou total. É parcial, quando uma pessoa deseja contrair o matrimônio segundo o seu livre modo de pensar e não segundo as exigências teológico-jurídicas do matrimônio em si mesmo. Pode ser de uma parte ou das duas, combinados previamente. É total, quando a vontade deliberada da pessoa não pretende contrair o matrimônio com nenhuma pessoa, com uma determinada pessoa ou quando não pretende contrair um matrimônio que seja para toda a vida. Nesse caso, a sua verdadeira intenção era uma simples união de fato, ou uma mera convivência de amizade, ou um matrimônio temporário, ou um matrimônio que tende por si mesmo ao divórcio, ou um matrimônio ad experimentum.
García Faílde, numa sentença de 1988, afirma que:
“Un contrayente puede conocer que la Iglesia católica enseña que todo matrimonio es indisoluble y que todo matrimonio de bautizados es sacramento, y a la vez puede estar en el error de que el matrimonio no es indisoluble o no es sacramento en cuanto que no acepta aquella enseñanza de la Iglesia católica y mantiene su concepción contraria del matrimonio no indisoluble y/o no sacramento”(c. GARCÍA FAÍLDE, Tribunal de la Rota de la Nunciatura Apostólica, 14/06/1988, in: Jurisprudencia matrimonial de los Tribunales Eclesiásticos españoles, Salamanca, 1991, p. 275).
Significa que a pessoa, mesmo tendo um conhecimento claro e distinto da doutrina da Igreja, pode excluir algum elemento da mesma em seu consentimento, em modo consciente, porque não o integra em seu entendimento.
A simulação – que também poderia ser qualificada de mentira – caracteriza-se por uma desconformidade entre o ato interno da vontade e a sua manifestação externa: afirma-se uma coisa, mas internamente se deseja outra coisa, diferente.
Ao apreciar a simulação – que somente é observável através de indícios, pois o ato da vontade não se manifesta diretamente – devemos perguntar-nos, em primeiro lugar, se existe razão suficiente para simular; em segundo lugar, se, de fato, deu-se a simulação. O nosso Código prescreve que a simulação seja realizada “por um ato positivo da vontade”, que exclua o próprio matrimônio ou alguma de suas propriedades essenciais ou algum de seus elementos essenciais. Não é, portanto, um simples não querer, ou ausência de vontade positiva, mas um querer que, do consentimento seja retirado o próprio matrimônio, algum dos seus elementos essenciais ou alguma de suas propriedades essenciais, como é o caso da sua sacramentalidade.

2. Aplicação do direito aos fatos


5. A Demandante afirma no libelo e confirma em seu depoimento que não tinha a menor noção do matrimônio como algo que durasse para sempre. Ela achava que se não desse certo, poderiam se separar, se divorciar, como acontece normalmente no civil. Também diz que estava mais interessada na ascensão profissional, que em ter filhos e cuidar de um lar. Não conseguiu consumar o matrimônio nos primeiros dias de casada, nem depois, porque não se sentia à vontade com o Demandado, pois não o amava o suficiente para entregar-se inteiramente à conjunção carnal. Diz ainda que se não fosse a doença de seu pai, acelerando sua decisão, não teria se casado jamais com o Demandado.
6. O Demandado deixou claro em seu depoimento que não entendeu o porquê de a Demandante ter dito o seu sim, se não o amava. Se ele soubesse disso, não teria se casado com ela. Também disse que a Demandante se mostrou muito nervosa às vésperas das núpcias e que se ela tivesse fugido naquele dia, teria sido melhor pra ele e para os convidados.
7. A primeira Testemunha arrolada afirmou que a Demandante não foi sincera na hora do seu consentimento, porque no fundo de seu coração não queria o matrimônio com o Demandado. Tal matrimônio foi um verdadeiro teatro, somente para contentar os familiares e convidados.
8. A segunda Testemunha diz que acompanhou de perto a vida dos dois, sendo sua vizinha. No dia do casamento, não precisaria de nenhum profissional para constatar que o nervosismo da Demandante, que a tristeza de seu rosto revelou o quanto ela seria infeliz naquele enlace. Cumpriram o protocolo, porque tudo estava preparado. Depois da lua de mel, ela me confidenciou que dormiram em camas separadas porque de fato estavam arrependidos já nos primeiros dias de casados.
9. A terceira Testemunha afirma que os dois planejavam se casar em agosto e que dois meses antes disso, ela dizia a mim, sua mãe, que não mais queria se casar porque não amava o Demandado. Ela chegou a conversar com meu esposo sobre isso, mas pelo fato dele ser muito tradicional no modo de pensar, disse que não seria conveniente cancelar tudo, em função do que a sociedade iria pensar dela. Momentos antes de dizer o seu sim ela teria dito que tinha muito medo do seu pai morrer de depressão, acaso ela não se casasse.
10. A quarta Testemunha confessa que as partes tinham relações sexuais frequentes antes de se casarem, mas depois das núpcias, dormiam em camas separadas, pelo fato de não se amarem. Diante disso, o Demandado passou a sair do lar e ter outras relações, porque não encontrava na Demandante mais nenhuma atração.
11. A quinta Testemunha alega que no dia da cerimônia a Demandante estava muito triste, chorando o tempo todo, porque teria que fazer algo que não era de sua vontade. O matrimônio faliu logo nos primeiros dias, porque de fato ela não queria se casar com ele. Só o fez, porque os familiares e a sociedade assim o queriam.
12. A tese da não consumação deste matrimônio foi descartada desde o início pela própria Demandante, porque seria muito difícil de ser provada, uma vez que ela já não era mais virgem e porque tiveram muitas relações sexuais completas durante os dois anos anos que antecederam as núpcias.

3. Conclusão

13. Os três juízes que avaliaram o processo em epígrafe chegaram à conclusão que este matrimônio foi inválido desde o início, tendo em vista não o capítulo da grave falta de discrição de juízo (can. 1095, 2°), porque tal motivo carece de fundamentos no processo. Contudo, chegaram à certeza moral que este matrimônio é nulo, porque a Demandante simulou o seu consentimento, ou seja, suas palavras pronunciadas na hora do seu sim estavam em desconformidade com o que ela queria. Portanto, naquele momento, ela não estava casando para toda a vida, mas somente para cumprir um ato social para contentar o que pensava o seu pai e os convidados. Logo depois do enlace, concluem os juízes que o matrimônio não poderia ter dado certo, porque os dois não demonstraram condições, nem para a conjunção carnal, porque não se amavam de verdade, nem para continuarem juntos, porque houve desde o início um defeito de consentimento, pela simulação total do matrimônio, por parte da Demandante (can. 1101, § 2).
A presente sentença foi homologada pelo Tribunal de Segunda Instância, deixando assim as partes livres para contraírem outro matrimônio na Igreja.

sábado, 28 de agosto de 2010

Diferença entre Convento e Mosteiro


Frei Ivo: Sempre tive a curiosidade de saber qual a diferença entre Convento e Mosteiro. Por que vocês são freis e os do São Bento são monges? Agradeço a atenção (Lygia).

Antes de entrar numa resposta objetiva, vamos percorrer um pouco os trilhos da vida religiosa consagrada.

A vida religiosa nasceu, cresceu e se desenvolveu do húmus do Evangelho. Os três fundadores das Ordens religiosas anteriores a São Francisco (São Basílio, Santo Agostinho e São Bento) foram os organizadores deste modo de vida em comunidade. Eles coordenaram a experiência religiosa dos seus primeiros seguidores, à serviço da Igreja na pregação, educação, assistência aos doentes, vida de oração e penitência, estruturando essa experiência num contexto eclesial organizado e institucionalizado em fraternidades. Assim, nascem as instituições de religião, denominadas: instituição de religião eremítica (São Basílio); instituição de religião canonical (Santo Agostinho); instituição de religião monástica (São Bento); e mais tarde, a instituição de religião apostólica (São Francisco de Assis).

A instituição eremítica caracteriza-se pelo abandono do mundo, para viver somente para Deus e por Deus. Porém a vivência eremítica não é total. Nessa instituição, os seus membros vivem momentos de afastamento (solidão) e momentos comunitários (laura + cenóbio). A laura expressa a forma de vida dos que passavam a maior parte do tempo nas grutas, em meditação, contemplação, vida de jejum a pão e água, penitência e artesanato. O cenóbio expressa a forma de vida comunitária, ao redor do mosteiro. Significa que os monges passavam durante a semana nas grutas e no sábado, voltavam ao cenóbio para celebrar a liturgia, o encontro fraterno e reabastecerem-se de material necessário ao artesanato, pão e água para mais uma semana vivida nas grutas e cavas do deserto. Ainda hoje encontramos eremitérios neste estilo de vida, sobretudo na Palestina, na Grécia e em outros locais, onde os monges vivem parte do tempo em grutas e parte do tempo em comunidade.

A instituição canonical sistematiza-se pelo seu estilo clerical, sendo religiosos presbíteros, dedicados aos trabalhos apostólicos. Exemplo disso são os canônicos de Santo Agostinho.

A instituição monástica evidencia-se pela renúncia da família por causa de Cristo. Em compensação, a oferta da ajuda fraterna faz com que os seus membros dediquem-se em ser dom aos irmãos. Sustentar a fragilidade dos irmãos do mosteiro é desafio constante. Toda a responsabilidade na condução deste modo de vida recai sobre o Abade. Os seus membros ao professarem os votos, destinam seus bens ao próprio mosteiro. A pregação, por sua vez, somente é possível com o mandato do Abade. O monge que recebe esse mandato, permanece como monge, mesmo tendo recebido uma missão temporária no meio do povo de Deus. Exemplo disso podemos encontrar nos monges beneditinos.

A instituição apostólica tornou-se uma novidade no cenário das instituições tradicionais na época medieval. Francisco de Assis era uma pessoa muito simples, despreocupado com a vida organizada em mosteiros ou outras estruturas de seu tempo. A sua pretensão era formar uma fraternidade, composta de Frades Menores, tanto leigos, quanto clérigos. Existiam outras estruturas, bem organizadas, que favoreciam todas as condições para alguém que quisesse ser religioso, tais como a estrutura eremítica, canonical ou monástica. A estrutura monástica, por exemplo, já era configurada na história da Igreja por vários séculos, com a sua famosa stabilitas loci, favorecendo um programa estável de habitação, louvor a Deus e trabalho (ora et labora). Os monges entravam no mosteiro e recebiam todo o conforto necessário ao seu bem temporal e espiritual, sempre sob o regime estável de governo do abade. Neste estilo de vida não faltava nada ao candidato. Além do mais, já era devidamente reconhecida a sua estrutura jurídico-canônica, sem correr o risco de caminhar paralelamente à comunhão eclesiástica, em confronto com os movimentos heréticos da época. Francisco não entrou numa destas estruturas do seu tempo, porque não se encontrou naquele ideal de vida, fechado, enclausurado. Inspirado por Deus, preferiu seguir um estilo de vida itinerante, que fosse além das muralhas de Assis, além dos confins de uma diocese ou de um mosteiro medieval. Indo a Roma, recebeu a aprovação da Igreja, acontecendo assim a fundação da Ordem dos Frades Menores.

Os ramos femininos da vida religiosa consagrada brotam do desmembramento destas instituições, formando assim as ordens ou congregações contemplativas ou apostólicas, de acordo com a tradição do seu fundador ou nas novas propostas, reconhecidas e aprovadas pela Igreja.

Voltando agora à questão apresentada pela internauta, podemos dizer que o termo Convento, do latim conventus, significa "assembleia". Esta denominação surgiu na época dos romanos, significando assim assembleia romana onde os cidadãos se congregavam para fins administrativos ou de justiça.
O Convento é confundido, muitas vezes, com Mosteiro. No passado, o Convento era edificado na zona urbana da cidade, normalmente delimitada por uma muralha. Já o Mosteiro era o oposto, sendo edificado fora da cidade, geralmente em montanhas ou encontas de desertos rochosos. Hoje, tanto o Convento, quanto o Mosteiro se confundem, porque a cidade cresceu ao seu redor. Exemplo disso é o Mosteiro de São Bento no Rio de Janeiro e em São Paulo.

A raiz inicial da diferença entre Convento e Mosteiro está relacionada com a sua fundação, ou seja, os frades vivem desde o início em Convento e os monges, vivem em Mosteiro. No Convento, os frades se reúnem temporiariamente para a vida fraterna em comum (oração, partilha dos trabalhos internos e externos, momentos de recreação). Vivem em modo diferenciado dos monges, porque a vida dentro do recinto do Convento é passageira, uma vez que a missão dos frades é itinerante. Já os monges vivem na estabilidade quase absoluta dentro de um Mosteiro. No Convento existem frades (freis) não ordenados ordenados (irmãos) e frades ordenados. Cada um segue a vocação a um chamado, seja para os ministérios não ordenados, seja para os ministérios ordenados. No Mosteiro encontramos a mesma configuração, relacionada ao sacramento da ordem ou não, ou seja, existem monges irmãos e monges sacerdotes. O guardião é o superior do Convento. O abade é o superior do Mosteiro.

Em resumo, tanto no estilo itinerante (Convento), quanto no estilo monástico (Mosteiro), ambos bebem da mesma fonte do Evangelho, vivendo na consagração de suas vidas, de acordo com o carisma de seu fundador.

sábado, 21 de agosto de 2010

É possível anular um batismo feito na Igreja católica?


Prezado Frei, preciso anular meu batizado, que foi um sonho realizado há 4 anos atrás. Tenho 34 anos e a madrinha que escolhi se esconde através da igreja, uma vez que sempre seguiu outra religião inaceitável para mim, além de só enaltecer o mal e os "sacrifícios". Preciso anular esse batizado para viver em paz, pois carrego este peso e estou depressiva em função disso. Preciso tirar esse vínculo da minha vida. Por favor, me ajude, me oriente! O que faço? Poderei fazer catecumenato novamente para outro batismo? Quais são as minhas chances de anular este batismo?

O batismo na água e no Espírito Santo é a porta de entrada e o fundamento de todos os sacramentos da Igreja. O batismo pela água, ou ao menos pelo desejo, é necessário à salvação (Jo 3, 5; Mc 16,16). O batismo de desejo compreende também o martírio (batismo de sangue, cf. MT 10, 32; 16, 25). Liberta o ser humano de todos os seus pecados, inclusive do pecado original. Regenera espiritualmente o ser humano e lhe constitui filho de Deus, através da Graça (Rm 8, 15; 2Pd 1, 4).

Do ponto de vista teológico-jurídico, os sacramentos são direitos de um povo que é sacerdotal pela própria natureza (cânon 835). Resulta daí que todos os fiéis cristãos participam, cada um no exercício que lhe é peculiar, do múnus de ensinar, santificar e reger da Igreja. Pelo batismo, que é o portal dos demais sacramentos, todos integram o sacerdócio comum de Cristo. Nessa perspectiva, o fiel cristão é inserido nesse sacerdócio e por conseguinte, passa a ser sujeito de direito fundamental aos demais sacramentos, instituídos por Cristo e organizados pela Igreja.

O Código de Direito Canônico é taxativo, quando afirma que “os ministros sagrados não podem negar os sacramentos àqueles que os pedirem oportunamente, que estiverem devidamente dispostos e que pelo direito não forem proibidos de os receber”(cânon 843, § 1). Em outras palavras, é uma obrigação (dever) dos ministros sagrados, que corresponde a um direito da parte dos fiéis cristãos. A obrigação, por outro lado, é um dever de justiça, sobretudo aos ministros encarregados na cura de uma comunidade.

Configurando a questão apresentada pela internauta, o Código da Igreja afirma o seguinte:
“§ 1. Para que uma criança seja licitamente batizada, é necessário que: 1° - os pais, ou ao menos um deles ou quem legitimamente faz as suas vezes, consintam; 2° - haja fundada esperança de que será educada na religião católica; se essa esperança faltar de todo, o batismo seja adiado segundo as prescrições do direito particular, avisando-se aos pais sobre o motivo. § 2. Em perigo de morte, a criança filha de pais católicos, e mesmo não-católicos, é licitamente batizada mesmo contra a vontade dos pais” (Cânon 868).

Como se percebe no presente texto, deve haver o consentimento dos pais, ou dos responsáveis pela criança, para que ela seja batizada na Igreja. Contudo, a norma não limita a questão aos dois genitores da criança. O texto afirma que podem ser os pais, ou ao menos um deles... Significa que prevalece o direito ao batismo, mesmo que uma parte não concorde com o mesmo.

Em relação aos padrinhos do batizado, o cânon 874 do nosso Código apresenta os seguintes requisitos:
1) Que sejam idôneos para exercer essa função;
2) Que sejam designados pelo próprio batizando, pelos pais, pelo pároco ou pelo ministro;
3) Que tenham 16 anos de idade completos;
4) Que sejam católicos, já crismados e tenham feito a primeira Eucaristia;
5) Que não sejam passivos de penas canônicas;
6) Que não sejam o pai ou a mãe do batizando.

É importante recordar que o Código admite “um só padrinho ou uma só madrinha, ou também um padrinho e uma madrinha”(cânon 873). Em base a esse cânon, onde a realidade ecumênica for possível, se pode, por exemplo, colocar um padrinho católico e um padrinho de outra religião cristã, desde que concorde com a parte católica, sem o prejuízo da educação na fé do batizando. Nesse caso, a parte acatólica não é um verdadeiro padrinho, mas funciona como testemunha do batizado.

Na praxe pastoral, acontecem casos como esse em que os pais ou os próprios batizados estão arrependidos com os padrinhos. Daí, perguntam: - Frei, a gente pode anular, ou arranjar outros padrinhos? Infelizmente, a resposta é negativa. O cânon 872 deixa aberta a possibilidade de não haver padrinhos, quando diz que: “Ao batizando, enquanto possível, seja dado um padrinho, a quem cabe acompanhar o batizando adulto na iniciação cristã e, junto com os pais, apresentar ao batismo o batizando criança”.

Os padrinhos, se convidados, podem ajudar no cumprimento das obrigações essenciais do batizado. Porém, não lhes são essenciais. Além do mais, na maioria das vezes os padrinhos são uma espécie de arranjo, um status social, para dar presentes ao batizando e para cumprir ou devolver favores entre as famílias. Do ponto de vista da ajuda no cumprimento das obrigações cristãs, pouco ou quase nada fazem. E por último, seria ridículo ter que fazer outra celebração (re-batismo) e, sem contar, que os nomes dos padrinhos, se houver, já estão registrados no Livro de batismos e não podem ser cancelados.

Voltando ao caso, de acordo com o cânon 845, § 1, os sacramentos do batismo, confirmação e ordem, já que imprimem caráter, não podem ser repetidos, porque revestem o ser humano de Cristo (Gl 3, 27), tornando-o membro de seu Corpo (1Cor 12, 12-13), constituindo-o em Povo de Deus.

Em base ao exposto, conclui-se que o batismo imprime caráter e, por isso, não pode ser repetido, salvo restando se foi inválido pela própria natureza (batismo realizado numa Igreja não aceita pela Igreja Católica). A responsabilidade do batismo de crianças recai sobre os pais ou responsáveis pelas mesmas. Mesmo que haja o consentimento somente de um dos genitores, o batismo seja administrado e não pode ser cancelado. Também não se pode anular os padrinhos, ou um deles, uma vez que o Código admite a possibilidade de não convidá-los. Porém, uma vez convidados, enquanto testemunhas do ato e enquanto corresponsáveis em tutelar a fé da criança batizada, a resposta da Igreja é: nem o batismo válido pode ser deletado, nem os padrinhos.

Aconselhamos a internauta a trabalhar melhor a sua fé, para que o seu batismo seja fecundo e continue produzindo o seu efeito, não obstante a sua negação e a dos padrinhos. E que o Espírito do Senhor a ajude a contornar esta situação em busca de melhores dias, pelo perdão e pela misericórdia de Deus diante de pessoas que nem sempre cumprem a sua função no testemunho da fé, esperança e caridade.

sábado, 14 de agosto de 2010

Diferença entre paróquia e santuário


Sou um pároco bastante jovem. Atuo numa paróquia que fica a um quilômetro da catedral. Esta paróquia, pelo fato de haver uma boa presença de religiosos consagrados, tradicionalmente atende quase todas as confissões de uma cidade de quase 250 mil habitantes. Inclusive o pároco da catedral e os párocos das outras paróquias remetem seus paroquianos para a nossa paróquia, porque sabem que sempre tem turnos de confissões. Além disso, muita gente que frequenta a nossa paróquia vem de longe, porque se sente atraída pela devoção popular ao seu padroeiro e também pelo bom serviço religioso, voltado ao atendimento dos fiéis, não só nas confissões, mas também nas suas várias celebrações, como se fosse um santuário. Daí eu pergunto: não seria melhor transformá-la em santuário, em vez de paróquia? E quais seriam os passos, para que isso pudesse acontecer oficialmente na Igreja?

A inquietação apresentada pelo jovem pároco faz parte do cenário de muitas paróquias do Brasil, que poderiam tranquilamente passar ao status de Santuário. Mas antes de dar a resposta, vamos dar uma rápida revoada pelas diferenças que existem entre os dois institutos jurídicos.

1. A configuração da paróquia no cenário da Igreja

Nos primeiros séculos da era cristã, existiam somente as Catedrais, onde o povo se congregava ao redor do seu bispo e dos seus presbíteros nas celebrações. Porém, na medida em que se expandia a missão da Igreja, foram organizadas as paróquias, como porções do Povo de Deus, um tanto distantes das Catedrais, mas em comunhão com o Bispo. Esta configuração de paróquia ainda era escassa no cenário da Igreja. A partir de 1150, fruto do confronto entre ricos proprietários, nobres, que pretendiam haver o domínio da Igreja em mãos, a Igreja viu-se na necessidade de organizar a vida do Povo de Deus em pequenas porções do rebanho de Cristo. Também, percebeu-se na necessidade de confiar essa porção aos cuidados de um pastor, chamado, na época, de vigário. Os vigários eram nomeados pelos Bispos e não pelos fazendeiros. Assim, a paróquia surgiu como alternativa aos grandes centros (catedrais). Em cada sítio ou povoado havia uma paróquia, com média de 500 habitantes (fiéis cristãos católicos). O vigário era o seu encarregado, também chamado de cura d’almas. Ele tinha a incumbência de cuidar para que essa porção do Povo de Deus pudesse ser evangelizada, sobretudo na questão da vida religiosa de seus habitantes.
O Concílio Lateranense IV (1215) determinava que cada cristão devia confessar-se e comungar na sua própria paróquia, ao menos uma vez por ano. Somente o vigário (pároco) podia administrar o batismo e assistir o matrimônio.
A partir do Concílio Vaticano II, a paróquia ganhou autonomia. O pároco não é simplesmente um vigário do Bispo, mas é o pastor próprio da paróquia a ele confiada, sob a autoridade do Bispo (can. 519). A paróquia legitimamente erigida tem personalidade jurídica pelo próprio direito (can. 515, § 3). O pároco é o seu legítimo representante, nomeado pelo Bispo, por um tempo determinado (can. 522). A CNBB (Conferência dos Bispos do Brasil) determina que o Bispo diocesano nomeie os párocos por um período não inferior a seis anos.
A organização paroquial é territorial, por uma simples questão de tradição. No entanto, o novo Código permite a organização de paróquias pessoais, segundo a necessidade de ritos, língua, nacionalidade ou outras razões (can. 518).

2. A configuração do santuário no cenário da Igreja

O santuário, do latim sanctuarium, é o lugar para onde afluem peregrinos e romeiros, atraídos pela veneração do santo que é cultuado naquele recinto. É o lugar da presença de Deus, a ponto de ser denominado na Bíblia como santíssimo (Lv 16,16), tendo no seu interior uma parte reservada ao tabernáculo, como foi no templo de Jerusalém.
No Direito da Igreja, o santuário é denominado como igreja ou lugar sagrado, ao qual afluem em grande número, por algum motivo especial de piedade, os peregrinos (can. 1230). A motivação pode ser uma imagem, uma relíquia ou um milagre acontecido no local em modo sobrenatural. Exemplos disso podemos perceber aqui no Brasil, no Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, de Madre (Santa) Paulina. ou de outros santuários que se tornaram lugares de culto pelo seu imemorável costume.
Os santuários podem ser diocesanos, se houve a aprovação do Bispo; nacionais, se houve a aprovação da Conferência Episcopal; internacionais, se houve a aprovação da Santa Sé (can. 1231). A sua finalidade, autonomia, domínio e administração dos bens temporais são determinados nos estatutos, que devem ser aprovados pela respectiva autoridade competente da Igreja (can. 1232, § 1). Já a personalidade jurídica, depende sempre das circunstâncias locais, de acordo com o direito próprio de cada santuário. Exemplo: um santuário pertentencente a um instituto de vida consagrada ou sociedade de vida apostólica, tem a sua personalidade jurídica autônoma ou pode ter a sua personalidade jurídica desmembrada no próprio instituto. Do mesmo modo a nomeação ou designação do seu reitor, depende sempre do que rezam os seus estatutos.
Há uma ressalva sobre a questão do decreto, que nem sempre existe. Há santuários que se consolidaram pela sua tradição, mediante a afluência centenária ou imemorial dos peregrinos ao local (can. 26). Assim, desde que não seja contrário ao direito divino (can. 24, § 1), um santuário pode adquirir o seu status de aprovação pelo próprio costume. Exemplo disso é o Convento Santo Antônio do Rio de Janeiro, que é considerado santuário desde há mais de 400 anos, não obstante careça de um decreto de ereção a santuário.
É interessante recordar ainda que o Código de Direito Canônico dá grande importância ao santuário, como local privilegiado da prática e devoção religiosa popular. Daí a importância de bem organizar a ação evangelizadora dentro do mesmo, usando como meios privilegiados a pregação da palavra de Deus, de uma fecunda vida litúrgica, mediante a Eucaristia, a Penitência e outras formas de piedade (can. 1234). A celebração penitencial, por exemplo, deve ser proporcionada a todos aqueles que a procuram, como reconciliação profunda com Deus e com a Igreja. O Papa João Paulo II, numa de suas homilias dirigidas aos reitores de santuários (22 de janeiro de 1981), afirmava: “Acima de tudo, que toda a vida dos santuários favoreça, do melhor modo possível, a prece pessoal e comunitária, a alegria e o recolhimento, a escuta e a meditação da palavra de Deus, a celebração verdadeiramente digna da Eucaristia e a recepção pessoal do sacramento da Reconciliação”.

3. Diferenças entre paróquia e santuário

Do ponto de vista jurídico, ambos os institutos necessitam da aprovação da autoridade competente da Igreja para a sua ereção, salvo restando que a ereção do santuário seja tradicionalmente aceita como centenária ou imemorial.
Em relação às diferenças específicas, podemos elencar as seguintes:
1) A paróquia é o lugar onde os fiéis frequentam e se associam, através do dízimo ou outra forma de manutenção. O santuário vive, sobretudo, das intenções de missas, das esmolas e das doações depositadas em seus cofres;
2) A paróquia necessita de uma estrutura colegiada para o seu gerenciamento, tais, como os conselho pastoral paroquial e comunitário, o conselho econômico, a estruturação das várias pastorais e movimentos, onde o pároco e os vigários ocupam grande parte do tempo para o seu gerenciamento com uma agenda cheia de compromissos, que praticamente os impedem ao atendimento das confissões, aconselhamentos, visitas, bênçãos. O santuário, por estar livre destas estruturas, dedica todo o seu tempo para as celebrações eucarísticas, confissões, bênçãos, atendimento personalizado e até para algumas visitas domiciliares aos fiéis;
3) A paróquia tem uma forte estrutura voltada aos sacramentos, com cursos preparatórios, livros de registros e celebrações. O santuário, mesmo que acolha algumas celebrações, próprias de uma paróquia, como um batismo ou um matrimônio, basta que exija a documentação transferida da paróquia e a devolva, depois de celebrados os devidos sacramentos;
4) A paróquia está atrelada às reuniões da diocese, bem como às taxas que são estipuladas pela mitra diocesana. O santuário tem mais tempo para o atendimento de seus fiéis, salvo restando o tempo dedicado nos eventos comuns da diocese e das contribuições que eventualmente são solicitadas pelo ordinário local;
5) O povo que frequenta a paróquia, embora pudesse haver paróquias pessoais, ainda é um povo muito local, que normalmente reside em seus entornos. Já o santuário, acolhe peregrinos e romeiros de longe e de perto, que via de regra, são itinerantes no local. Por isso, no santuário, dificilmente se pode instaurar uma pastoral de continuidade, à diferença do público alvo de uma paróquia.

Em base ao exposto, tendo como motivação o caso em tela, mirando o bem maior que se possa oferecer ao povo de Deus, um local que tenha vocação de santuário poderia perfeitamente ser transformado em santuário. Eis os encaminhamentos a serem dados:
1) Discutir antes com a comunidade local, se isso seria conveniente, consultando a assembléia paroquial;
2) Se o parecer for favorável, solicitar do Superior competente (ordinário do religioso) a aprovação da ereção da paróquia em santuário, anexando no pedido as devidas motivações;
3) Se o parecer do ordinário próprio e do seu conselho for favorável, o próprio Superior deve levar a questão até o bispo, solicitando-lhe a aprovação, bem como o seu decreto de ereção em santuário.

E que assim os religiosos, diante do seu dedicado e peculiar serviço à ação evangelizadora da Igreja, possam ser respaldados pela aprovação da autoridade competente, transformando a paróquia em santuário.

sábado, 31 de julho de 2010

Celebração de exéquias a um suicida


Uma pessoa é católica praticante, porém por desgostos pessoas com a vida, enforcou-se. Antigamente, não se podia celebrar a missa de corpo presente. Hoje, isso seria possível?
O internauta parte do pressuposto de já conhecer a normativa do Código de Direito Canônico de 1917. Contudo, tendo em vista uma resposta mais convincente, já que a maioria de nossos internautas (paroquianos virtuais) não teve acesso às normas daquele Código, apresento duas breves alavancas como resposta, tendo como base os dois Códigos:

1. A privação das exéquias no Código de 1917

O cânon 1240 do Código de 1917 era taxativo, ao afirmar que estavam privados de sepultura eclesiástica, salvo restando que tivessem manifestado algum sinal de arrependimento antes da morte:
1. Os apóstatas notórios da fé cristã e os que eram afiliados a uma seita herética, cismática, à seita maçônica ou outra afiliação do mesmo gênero;
2. Os excomungados ou interditados, após a sentença condenatória ou declaratória;
3. Os que se suicidaram, deliberadamente;
4. Os que morriam em duelo ou de um ferimento nele recebido;
5. Os que solicitaram a cremação de seu cadáver;
6. Os pecadores públicos e manifestos.
Determinava ainda o mesmo cânon, parágrafo segundo, que em caso de dúvida, fosse consultado o Ordinário do lugar. Somente se concedia a sepultura eclesiástica, caso isso não provocasse escândalo na comunidade. E uma vez que era negada a sepultura eclesiástica a um fiel cristão, negava-se-lhe também a missa exequial (missa de corpo presente).

2. A privação das exéquias no Código de 1983

O Código de 1983 admite que sejam celebradas as missas de corpo presente até mesmo aos catecúmenos, às crianças que morreram sem serem batizadas e aos batizados não católicos (cânon 1183). No caso dos catecúmenos, são admitidos, porque são pessoas que já estão inseridos na comunidade eclesial e são equiparados aos batizados. No caso de crianças não batizadas, são admitidas com a licença do Ordinário local, desde que os genitores manifestem que pretendiam o seu batismo na Igreja. E no caso dos cristãos acatólicos, podem ser admitidos, desde que eles não tenham manifestado uma vontade contrária a isso.

Em relação à privação das exéquias eclesiásticas, o cânon 1184 legisla que são excluídos:
1) Os apóstatas, os hereges e os cismáticos notórios;
2) Os que escolheram a cremação de seus corpos, por motivos contrários à fé cristã;
3) Os outros pecadores manifestos, caso forem motivo de escândalo público.
Reza ainda o cânon que em caso de dúvida, seja consultado o Ordinário local (cânon 1184, § 2). E a quem são negadas as exéquias, também lhes é negada a missa de corpo presente (cânon 1185).

Fazendo um paralelo entre os dois Códigos, podemos colher as seguintes orientações, à guisa de conclusões:
1)A normativa atual é menos restritiva, colocando apenas algumas balizas orientativas, deixando a critério do bom senso do pároco ou do administrador paroquial uma margem muito larga, sobretudo voltada para inclusão e não tanto à exclusão das exéquias, como era no Código anterior;
2)Não são mais privados de exéquias os que pretendem a cremação de seus corpos, salvo restando que sejam por motivos contrários à doutrina cristã (cânon 1176, § 3);
3)Não são mais privados de exéquias os cristãos que, não obstante sejam católicos, tenham se afiliado a um movimento religioso ou teosófico não católico, como era o caso, por exemplo, da maçonaria. Basta que isso não provoque escândalo na comunidade.

Portanto, aplicando o Código de 1917 ao caso em tela, o internauta não teria dúvida em negar a sua celebração de corpo presente, como era o caso de uma pessoa que suicidava, pelo enforcamento. Hoje, havendo como panorama de fundo o critério da misericórdia sobre a lei e da salvação das pessoas (cânon 1752), aliado à evolução das ciências na compreensão mais profundo do ser humano, não temos elementos objetivos para excluir da celebração de corpo presente um caso como esse, pelo simples fato de não sabermos os reais motivos do seu enforcamento. Antes de toda e qualquer atitude condenatória, tenhamos presente a mensagem de Cristo, legada à humanidade no momento crucial de sua morte, ao bom ladrão: “Hoje mesmo estarás presente comigo no paraíso”(Lc 23,43).

sábado, 17 de julho de 2010

Casamento com imaturidade afetiva




1. Eduardo, quando conheceu Mônica, tinha apenas 18 anos de idade e ela, 14. Eram pessoas do grupo de jovens na comunidade onde residiam. Após algumas paqueras, iniciaram o seu namoro e envolveram-se numa apaixonante relação, que resultou em gravidez seis meses depois do primeiro olhar. Então, para não escandalizar os pais e a sociedade, aceleraram o processo em vista das núpcias. Casaram-se primeiramente no civil, devido a uma certa pressão sofrida dos pais e, cinco meses depois, contraíram matrimônio na Igreja, somente porque a Pastoral do Batismo exigiu deles o matrimônio para que pudessem batizar a filha na comunidade. Com um pouco de sacrifício, conseguiram levar adiante a vida conjugal por cerca de dois anos e, quando estava prestes a nascer a segunda filha, Mônica envolveu-se num relacionamento com um primo seu. Isso foi a gota d’água para que Eduardo tomasse consciência de que casou-se em modo imaturo, sem saber direito o que estava assumindo. Com o esfriamento na vida a dois, entre altos e baixos, não conseguiram permanecer no vínculo por seis anos. A iniciativa da separação foi dele. Não conseguindo reconciliar-se com ela, resolveu por bem apresentar o seu súplice libelo ao Tribunal da Igreja, na expectativa da nulidade de seu matrimônio com Mônica.
2. O Tribunal acolheu o seu pedido, invocando como possíveis causas de nulidade matrimonial a base dos seguinte capítulos:
1) Por grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e deveres matrimoniais por parte de ambos (can. 1095, 2°);
2) Por medo grave proveniente de causa externa, sofrido por ambos (can. 1103).
3. Mônica foi devidamente convocada para contestar a lide, porém, não compareceu, nem justificou o seu pleito. Convocada oficialmente para depor, também não compareceu. Por conseguinte, foi declarada ausente no processo.
4. As Testemunhas arroladas compareceram, lançando assim um facho de luz sobre a história apresentada no libelo. Resumidamente, alegaram no processo as seguintes afirmações:
“Os dois se relacionaram sexualmente, porque estavam cegos de paixão naquele momento. Descobriram que Mônica estava grávida e então, para não fazer feio diante da comunidade e da família, decidiu acelerar a data do casamento. Casaram-se primeiro no civil e, para poder batizar a filha, encaminharam tudo às pressas na Igreja. A festa foi fria, com apenas algumas pessoas convidas”(Tia de Mônica);
“Eduardo e Mônica casaram-se apenas para reparar um erro cometido, porque ambos tinham medo de seus pais. Mônica não foi uma boa esposa, pois não sabia fazer as coisas do lar e, logo depois, cometeu infidelidades com o seu primo, tendo com ele várias relações sexuais. Quando Eduardo veio a descobrir, separaram-se e não conseguiram viver mais debaixo do mesmo teto”(Mãe de Eduardo);
“O pai de Eduardo era muito severo, um tipo italiano, que dava as ordens e todos tinham que cumprir. Eduardo ficou com medo diante da gravidez inesperada. Além disso, ele era um tipo adolescentão, que continuava a sua vida de solteiro, fugindo à noite para beber com os amigos, farras, bailes. E Mônica, continuou como se fosse solteirona, vindo inclusive a cometer traições contra o seu marido. Teve várias relações sexuais com seu primo. Quando Eduardo descobriu, resolveu se separar dela”(Irmão de Mônica).
5. As demais Testemunhas confirmaram a versão dos fatos apresentados no processo.
6. Houve uma perícia sobre os autos do processo, que concluiu, dentre outras coisas, “que Eduardo não recebeu educação sexual e Mônica foi a sua primeira parceira sexual. Por ter engravidado Mônica, teve ele consciência do seu erro e manifestou fortes sentimentos de culpa. Recorreu ao casamento para reparar o erro. Mônica era sedutora, liberal, usava roupas provocantes e andava com muitas amigas de infância, mesmo depois de casada”(Dr. Perito).
7. O medo grave, apontado como possível capítulo de nulidade, deve ser uma causa externa, como condição sem a qual a pessoa teria não teria saída, a não ser o casamento. Os juízes concluíram que existiu uma certa influência da família, mas isso não ficou comprovado nos autos, que fosse provocado por uma causa externa. O verdadeiro motivo do fracasso desse matrimônio não está focado sobre o medo, mas sobre a imaturidade das partes.
8. As partes eram bastante jovens ao iniciarem o seu namoro e, cinco meses depois, tiveram que casar, por causa da gravidez de Mônica. Casaram-se primeiramente no civil e, por influência dos genitores de Eduardo, aceleram as coisas em vista do matrimônio na Igreja, sendo influenciados também pela equipe de preparação ao batismo, como se o matrimônio Igreja fosse exigência para batizar a filha na comunidade de fé. Tal influência não se caracteriza como medo referencial, porém, como interferência numa decisão que não estava madura naquele momento.
9. O casal poderia ter permanecido somente no vínculo civil. Porém, obnubilado pela imaturidade afetiva daquele momento, não tiveram outra saída, que o matrimônio na Igreja.
10. Depois do nascimento da primeira filha, Mônica passou a secundar o relacionamento amoroso com seu cônjuge, vindo a cometer infidelidades conjugais com outra pessoa. Isso não se caracteriza uma mentalidade de exclusão da fidelidade. Contudo, esta sua atitude revela o quanto ela foi imatura e continuou a sê-lo, depois das núpcias.
11. Na hora do consentimento matrimonial, as partes estavam ofuscadas pela onda da gravidez inesperada, a ponto de não perceber que tudo o que lhes era dito carecia de verdades. Isso revela a imaturidade afetiva dos dois, que poderiam muito ter insistido em dar um tempo a mais. Em resumo, não estavam em condições de proferir o consentimento em modo deliberado e definitivo. Casaram-se na Igreja como se fossem dois adolescentes, totalmente desprovidos de convicções sobre o que estavam assumindo.
12. Em base ao exposto, o Tribunal Eclesiástico declarou a nulidade desse matrimônio, sendo homologado em Segunda Instância, pela grave falta de discrição de juízo a respeito dos direitos e deveres matrimoniais por parte de ambos (can. 1095, 2°).

sábado, 3 de julho de 2010

Cartas Dimissórias


Sou diácono de uma Província religiosa, que é um instituto religioso clerical de direito pontifício. Sou domiciliado na cidade de São Paulo, porém, resido na cidade do Rio de Janeiro, numa fraternidade religiosa, onde pretendo ser ordenado presbítero. Na hora de escolher o bispo ordenante, pensei em convidar o arcebispo local, mas ele estaria viajando. Então me veio a idéia de convidar outro bispo, franciscano, de outra diocese. Aí me vieram as dúvidas: posso fazer isso, depois de consultado o meu ministro provincial? Haveria algum documento necessário para que a ordenação seja feita aqui na diocese e por outro bispo?

A presente questão é norteada pela exigência das Cartas Dimissórias.
A Carta Dimissória é um documento oficial da Igreja que prova autenticamente a licença concedida pelo ordinário próprio do diácono religioso, para que outro ordinário – com caráter episcopal – possa ordená-lo validamente (can. 1015). Tal documento faz parte do cenário da Igreja desde o Concílio de Nicéia (325). Este Concílio decretava que seria inválida a ordenação de um súdito, que não fosse do próprio ordinário. A precaução foi decretada para evitar o vagar de clérigos de uma diocese à outra, ou de uma congregação à outra. Não podemos esquecer que para os clérigos seculares (diocesanos), a ordenação diaconal cria o vínculo da incardinação na diocese. Para os religiosos consagrados, a incardinação acontece no instituto com sua adscrição definitiva, pela profissão perpétua. Em outras palavras, o ordinário do religioso consagrado não é o bispo onde ele reside. O seu ordinário próprio é o superior competente, que só não o ordena, porque não é revestido do caráter episcopal. Daí a importância de o ordinário próprio conceder a Carta Dimissória para que o bispo diocesano, ou outro bispo, o ordene validamente.

As Cartas Dimissórias obedecem aos seguintes requisitos:
1) Não sejam concedidas sem a obtenção das devidas informações e documentos exigidos à ordenação, de acordo com os cânones 1050 e 1051;
2) Podem ser dadas a qualquer bispo, desde que esteja em comunhão com a Sé Apostólica, excetuando-se apenas os bispos de ritos diferentes, salvo restando que tenham o indulto apostólico (can. 1021);
3) O bispo que as recebe não proceda à ordenação sem que conste da autenticidade desse documento (can. 1022);
4) Uma vez concedidas, as Cartas Dimissórias não caducam, nem são revogadas, a não ser por um ato de quem as concedeu ou que cessem seus direitos (can. 1023);
5) Sem as Cartas Dimissórias, o bispo ordenante não poderá ordenar validamente um clérigo que são esteja incardinado em sua diocese, incorrendo, neste caso, em proibição de ordenações por um ano e na suspensão do uso de ordens recebidas, pelo próprio fato, ao que foi ordenado por ele (can. 1383).

Em base ao exposto, o caso em tela deve culminar nos seguintes encaminhamentos:
1) Antes de tudo, o ordinário próprio do religioso deve consultar o bispo ordenante. Tal consulta não é complicada. Basta um telefonema do ministro provincial, ou do próprio ordenando, desde que ele tenha o sinal verde do seu superior;
2) O ordinário próprio faz então uma solicitação ao bispo local (arcebispo), para que um bispo de outra diocese possa ordenar o religioso dentro de sua circunscrição eclesiástica. Tal solicitação também pode ser feita pelo telefone, por fax, por e-mail ou por carta;
3) A partir da resposta do bispo, onde reside o ordenando, desencadeia então o terceiro encaminhamento, que são as Cartas Dimissórias, a serem concedidas pelo ordinário próprio e encaminhadas ao bispo convidado, para que ele ordene validamente o religioso de seu instituto.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Peregrinação à Terra Santa

Tendo em vista a conclusão desta longa pausa nos assuntos de Direito Canônico, que comumente são publicados neste espaço, fechamos com chave de ouro tal pausa, reportando aqui o depoimento do peregrino Armelino Girardi:

"Com um grupo de peregrinos, eu e minha esposa realizamos, no mês de junho, uma viagem à Terra Santa, motivados pelo desejo de conhecer, segundo a Bíblia, os locais por onde Jesus andou e também para celebrar os 35 anos de nosso casamento. Foi, portanto, a viagem dos sonhos.
De início, as costumeiras preocupações, especialmente pelos constantes atritos entre judeus e palestinos que a mídia nos mostra. A realidade, no entanto, se mostrou bem diferente, surpreendente, muito melhor do que o imaginado. Os atritos da faixa de Gaza ocorrem numa região bem distante. Foi incrível perceber a simpatia que tanto judeus como palestinos têm pelo Brasil e pelos brasileiros. Em todos os locais fomos bem recebidos e vimos muitas bandeiras do Brasil nas casas e prédios.
A Terra Santa, uma porção de terra menor do que o estado do Sergipe, com cerca de 7 milhões de habitantes, é um testemunho vivo do que restou da história, envolvendo o Antigo e o Novo Testamento.
Israel é considerado um exemplo de agricultura, graças à inteligência aplicada aos desertos, com a irrigação. Foram anos de pesquisa, na tecnologia da gota, para que o deserto pudesse florescer. Com água e técnica, a terra produz. Tel Aviv, que significa colina da primavera, é uma cidade contemporânea, com suas lindas praias e edifícios modernos, com quase 1 milhão de habitantes, a maioria liberal no que se refere à religião.
Visitar Israel, além de uma peregrinação, é também uma viagem pela história da humanidade, pois nos leva a lugares e culturas milenares, conhecendo uma das regiões mais ricas em história, cultura e diversidade de tradições e povos. As ruínas de Jerusalém, com seus mais de 3 mil anos de história, são um testemunho vivo de que as gerações passam, mas as pedras, mesmo não falando, continuam para nos contar a sua história. Diante dessa panorâmica, fizemos uma retrospectiva histórica, uma caminhada ao passado para entender o presente dos lugares considerados santos.
Passamos os primeiros dias em Tiberíades, às margens do Mar da Galileia, que na verdade é denominado mar pelas suas dimensões. É um lago de 21 km de comprimento por 11 km de largura, situado a 210 metros abaixo do nível do mar, de onde é recolhida a maior parte da água que é distribuída a todo o Estado. Foi emocionante atravessar o lago na barca de Pedro, cenário onde Jesus de acordo com a Bíblia teria caminhado sobre as águas, lembrando e meditando sobre tantos fatos bíblicos ocorridos às margens do lago.
Foi uma bênção passar pelos mesmos locais por onde Jesus teria passado. Estar fisicamente nesses locais, participar de celebrações com a oportunidade de ler e meditar sobre os fatos neles ocorridos, oportunizou-nos conhecer uma realidade bem diferente da que imaginávamos. Ao visitar os mais diversos santuários em Nazaré, Caná da Galileia, Belém, Jerusalém, Jericó e locais como Monte Tabor, Monte das Bem-aventuranças, Rio Jordão e Mar Morto, passamos por emoções e sentimentos que ficarão gravados para sempre em nossos corações.
Conhecer Jerusalém foi algo extraordinário e nos ajudou a celebrar e tornar presente a memória do passado e aspectos de nossa cultura. É impossível descrever as emoções vivenciadas nas visitas e celebrações nos diversos locais. Especificamente em Jerusalém pudemos conhecer parte da complexa convivência entre povos com interesses, tradições e religiões diferentes.
Passando pelo deserto da Judeia chegamos a Jericó que apresenta ruínas com mais de 10mil anos de história. Tivemos oportunidade de banhar-nos no Mar Morto, situado a 400 metros abaixo do nível do mar, onde tudo é exótico, emocionante e singular. É considerado morto, porque as entradas são insuficientes para a sua manutenção e a causa do alto teor de salinidade de suas águas.
Voltamos diferentes e energizados espiritualmente para cumprir com maior fervor e comprometimento nossa missão de cristãos, agora com a vantagem de podermos entender e assimilar com maior facilidade a mensagem que Ele nos deixou.
Pudemos testemunhar também o grande esforço das diversas comunidades, especialmente dos franciscanos, na manutenção dos lugares sagrados, o que, aliás, deveria ser preocupação de todos os povos, pois são um patrimônio da humanidade.
Se visitar o Oriente Médio fizer parte de seus sonhos, não hesite, vá até lá que vale a pena".(http://www.agirardi.com.br).

sábado, 19 de junho de 2010

Testemunho dos Peregrinos 5


"Pudemos conhecer nestes dias parte da complexa convivencia entre povos com interesses, tradicoes e religioes diferentes. Ficou clara impressao de que dificilmente a solucao para os impasses pode surgir daqui, tera que vir de fora. A camiseta que encontramos numa das lojinhas das ruelas de Jerusalem antiga, com a imagem do Lula, da a entender que brasileiros podem contribuir neste processo de entendimento. Alem disto, como brasileiros, fomos sempre bem recebidos e festejados por israelitas e palestinos.
Saimos daqui felizes, carregados de energia para aprofundamento de nossa espiritualidade. Paz e Bem".(Mari e Marcio, Curitiba - PR).

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Betânia, Emaús e Via Dolorosa



Saímos cedo e fomos em direção à Betânia, contornando o Muro da Vergonha. Lá, celebramos a Eucaristia, refletindo sobre a hospitalidade de Maria a Jesus, sobre a importância do serviço e sobre a ressurreição de Lázaro.
O bairro onde é situado o Santuário de Betânia surgiu ao redor do Túmulo de Lázaro, inclusive muito conhecido pelos muçulmanos. Este lugar estava na mão dos cruzados, porém, passou para os turcos, e os muçulmanos têm uma mesquita sobre o túmulo, hoje. O santuário também passou por várias etapas da história. A primeira igreja bizantina foi edificada no século IV. Depois foi reedificada uma outra igreja bizantina, um pouco maior, no séc. V e VI. A grande basílica dos cruzados envolvia todo o terreno, incluindo o túmulo de Lázaro. A igreja moderna dos franciscanos, foi contruída pelo arquiteto Barluzzi em 1924. Impressionante são os afrescos, que representam as várias cenas da vida de Jesus na casa de Marta e de Maria.

Depois, nos dirigimos até Abu Ghosh, para reviver a experiência dos Discípulos de Emaús. Lá, lemos o texto de Lucas 24 e, como não tínhamos mais tempo para maiores explicações e partilha do texto, viemos em direção a Ein Karem e no caminho, Frei Ivo nos apresentou alguns eflúvios sobre a experiência de Emaús, nos desafiando a abrirmos espaço ao Mestre, que quer caminhar conosco.

Na parte da tarde, tomamos novamente o ônibus para uma experiência com os peregrinos comuns, ou seja, rezar a Via Sacra pelas mesmas ruas onde supostamente Jesus passou.
O início da Via Dolorosa é marcado pelo episódio da Flagelação de Cristo. O santuário faz parte do complexo do grande convento franciscano, que abriga o Studium Biblicum Franciscanum, que forma mestres e doutores em teologia bíblica. O recinto foi construído sobre os restos de ruínas bizantinas e cruzadas. A atual igreja foi edificada em 1904, e reedificada em 1929. No fundo do pátio em frente à Igreja se encontra o Litóstroto, que é o lugar onde colocaram a cruz sobre os ombros de Jesus.
A Via sacra é muito simples, com pequenas capelas em algumas estações, ou simplesmente uma inscrição da estação para recordar o lugar do caminho de Jesus com a cruz sobre os ombros, em direção do calvário. Na nona estação, depois de passar diante do patriarcado dos coptos, se pode visitar a capela dos etíopes. Devido às decisões do Status quo, estes pobres etíopes não tinham dinheiro para comprar os direitos de uso do Santo Sepulcro, como os franciscanos, gregos ortodoxos e armênios ortodoxos. Por isso, instalaram-se nas proximidades do Santo Sepulcro, oferecendo assim um espaço de culto e meditação aos seus monges e peregrinos.

Na parte da noite, tivemos um lindo momento de confraternização, com a revelação do amigo oculto (amigo secreto), nos refestelando com sementes secas (próprias do Oriente), regadas de suco de cevada e outras bebidas.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Santo Sepulcro e Encontro com o Custódio da Terra Santa


Acordamos logo cedo, tomamos café e fomos a Jerusalém, onde teríamos nossa Missa no Santo Sepulcro, conforme agendamento anterior. Enorme foi nossa surpresa, ao chegarmos lá e nos falarem que nosso horário já tinha passado, uma vez que seguem outro horário, que não é o horário de verão. Lamentamos profundamente, mas nada a fazer. Ainda bem que o sacristão nos concedeu uma outra capela, uns 20 metros de distância da edícula, para que pudéssemos celebrar nossa missa, na intenção de tanta gente que nos solicitou orações. A seguir, visitamos o Calvário e nos colocamos em fila para entrarmos no Sepulcro.
A grande Basílica do Santo Sepulcro engloba o Calvário, a Pedra da Unção, o Santo Sepulcro, o lugar da aparição à Maria e o encontro das Cruzes. O lugar era fora dos muros da cidade do tempo de Jesus. Era um lugar rochoso, onde fora construído o túmulo, doado por José de Arimatéia à família de Jesus. Era um dos lugares mais freqüentados pelos primeiros cristãos, que não tinham aqui nenhuma igreja. Em 135, o imperador Adriano resolveu apagar a memória dos cristãos, construindo um templo a Júpiter e a Vênus. Em 326, com a vinda do imperador Constantino, o iluminado dos cristãos, construiu-se uma enorme basílica, englobando todos os lugares acima mencionados. Este lugar passou pela destruição dos muçulmanos, turcos e otomanos, e também por terremotos. Por isso, a atual basílica consta apenas de restos dos tempos anteriores. A reconstrução feita pelos cruzados foi retomada por Constantino Monômaco em 1048. A grande cúpula foi refeita em 1869 e em 1949, por causa de incêndios. A presença franciscana no Santo Sepulcro é desde 1309. Desde a entrada dos franciscanos até o início do século passado, todos deviam pagar ingresso para entrar nesta basílica, porque os muçulmanos não abriram mão do cuidado da porta, que continua até hoje na mão de uma família muçulmana. Somente com o acordo do Status Quo, feito no século passado, entre católicos, gregos ortodoxos, armênios ortodoxos e coptos ortodoxos (somente a parte de trás da edícula), os peregrinos passaram a ser isentos do pagamento de ingresso. Cada comunidade, porém, além das regras do status quo sobre horários e espaços a serem usados em comum, deve pagar um contributo à soma exigida por essa família, encarregada de abrir e fechar a porta da basílica. À noite, ninguém pode entrar ou sair da basílica, a não ser nos horários de celebrações solenes das comunidades.

Às 9h40 tivemos o encontro com o Vice-Custódio da Terra Santa, Frei Artêmio Vitores, que nos recebeu de braços abertos para uma explicação do que é a Custódia dos Lugares Santos, sua história e sua finalidade em bem aplicar os recursos oriundos do mundo inteiro, através das Coletas da Terra Santa. Tais recursos são aplicados na manutenção dos santuários e na manutenção dos cristãos que aqui vivem, para que esta Terra não se torne um museu e sim uma presença viva de cristãos locais. A Custódia se encarrega de conseguir trabalhos (oficinas, artesanato, atendimento nas pousadas, hotéis e santuários), bem como na construção e manutenção de habitações aos cristãos que aqui vivem.

Aí pelas 10h15, o guia liberou o grupo para as esperadas compras e outras visitas de interesse pessoal. Mesmo assim, a maioria preferiu voltar depois do almoço para Ein Karem, tendo em vista o merecido descanso, organização das malas, meditação e caminhadas.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Testemunho dos Peregrinos 4


“A experiência de peregrinar por esres caminhos trilhados por Jesus, mas também por Pessoas tão marcantes em nossas vidas de cristãos, como Nossa Senhora , São José, Santana, e outros tantos.
Visitar e rezar em tantos Santuarios que nos trazem lembranças, tudo aquilo que
aprendemos com nossos pais e depois ao longo da vida em muitas outras oportunidades. A Peregrinação pelos lugares Santos fortalece nossa fé, nos comove e nos entusiasma.
Vale a pena fazer uma peregrinaçao em grupo e com um Guia que nos acompanha com tanto carinho. Louvamos a Deus por esta oportunidade!” (Maria e Claudio, ENS, Curitiba – PR).

Esplanada do Templo e Basilica de Santana



Partimos logo cedo, indo diretamente para a Porta que acessa o Muro das Lamentacoes e a Esplanada do Templo. Visitamos todo o espaco onde fora destruido o ultimo Templo, no ano 70 d.C. Ali, os Muculmanos contruiram a Mesquita de Omar e de Al Aqsa, que permaneceram edificadas ate os nossos dias. Pudemos fazer fotos somente da parte externa, uma vez que as mantem fechadas por motivos de seguranca. Depois disso, celebramos a Santa Missa no Santuario da Flagelacao de Cristo. A seguir, visitamos a Basilica de Santana.
Na parte da tarde, fizemos a visita ao Museu do Holocausto, que foi muito bem organizado pelo Estado de Israel, demonstrando assim as barbaridades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial, contra os nossos avos na fe.
Na parte da noite, ficamos livres para bate-papos e ver os jogos da Copa!

terça-feira, 15 de junho de 2010

Monte Siao e Muro das Lamentacoes




Hoje iniciamos nossa pereginacao com uma missa no Cenaculo dos Franscicanos, localizado no Monte Siao. La fizemos memoria da ultima Ceia, instituicao da Eucaristia e Pentecostes. A seguir, visitamos o Cenaculo, onde acontenceu o Pentecoste. Depois disso, visitamos a Basilica da Dormicao de Maria, onde tivemos um momento mariano muito intenso e emocionante. Visitamos ainda uma Igreja Catolica Melquita, onde mais uma vez pudemos apreciar a beleza e a exuberancia dos seus Icones.
O Muro das Lamentacoes foi um momento impar, ja que tivemos contato com a forma de orar dos Judeus. Terminamos nosso dia visitando a Igreja do Galicantu, onde Pedro negou Cristo tres vezes.
Foi uma longa caminhada por Jerusalem e os peregrinos voltaram exaustos, porem felizes e tambem anciosos para verem a estreia do Brasil na Copa do Mundo de 2010.
(Colaboracao: Fabiana, Mariangela e Shirley Veronica)

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Testemunhos dos Peregrinos 3


“É com muita alegria que quero partilhar com todos, tudo o que estou sentindo aqui na Terra Santa, por onde passou Jesus. Hoje, passando pelo Monte das Oliveiras, refletimos muito sobre o sofrimento de Jesus e sobre todos os tipos de sofrimento e me despertou uma necessidade de uma conversão total da minha própria vida. Ficou evidente em mim esse desejo e com essa finalidade eu pedi assim como Jesus aqui neste lugar santo que seja feita a vontade de Deus em minha vida. Todos os dias eu peço a Deus que atenda as minhas preces que faço por todos os meus amigos e familiares. Beijos” (Zilene, Duque de Caxias - RJ).

“Após o jantar em nosso 'local de hospedagem' (palavras do Frei Ivo), nos reunimos ao luar em Israel, para comentar sobre tudo o que fizemos durante o dia, em nossa peregrinação. São tantas experiências ricas para nosso crescimento espiritual, como seres humanos, que estamos sempre muito alegres e felizes. Ontem, em especial, o papo foi engraçado e demos muitas risadas. Eu, particularmente, não gostei de conhecer o “Mar Morto”, e vou explicar o porquê. Sou uma pessoa que adoro água e banho de mar, mas o que senti foi o contrário de tudo isso. Para chegar até a água (calor acima de 40 graus), queimei toda a sola do pé ao pisar na terra quente, pois não tinha areia. Ao entrar na água você boia ou cai com a lama mole que ao pisar vai afundando. A boca e olhos ardem se a água respinga em alguma parte de seu rosto. Para melhorar, a água é um tanto “quentinha”. Concluindo, me senti fazendo o primeiro estágio no purgatório com todo aquele calor Brincadeirinha, tá! Abraços” (Mariangela, Curitiba, PR).

“Estamos realizando um sonho. Visitar Israel e a Terra Santa, além de uma peregrinação é também uma viagem pela história da humanidade, pois nos leva a lugares e culturas milenares. Estamos passando por emoções e sentimentos que ficarão gravados para sempre em nossos corações. É uma
bênção passar pelos mesmos locais onde Jesus passou. Estar fisicamente nesses locais, com a oportunidade de ler e meditar sobre os fatos neles ocorridos, nos oportuniza conhecer uma realidade bem diferente da que imaginavamos. Temos certeza de que voltaremos diferentes e energizados espiritualmente para cumprir com maior fervor e comprometimento nossa missão de cristãos, agora com a vantagem de podermos entender e assimilar com maior facilidade a Palavra de Deus. Podemos testemunhar também o grande esforço das diversas comunidades religiosas, especialmente dos franciscanos, na manutenção dos lugares sagrados, o que, aliás, deveria ser preocupação de todos os cristãos” (Isabel e Armelino Girardi, Curitiba – PR).

Monte das Oliveiras


Subimos o Monte das Oliveiras, de onibus, logo cedo, ate o Santuario de Betfage, que recorda o local onde Jesus montou o jumentinho para sua entrada triunfal em Jerusalem. La, visitamos os lindos afrescos da igreja e a seguir, estivemos no lugar da Ascensao e do Pai Nosso. Dando sequencia, descemos o monte a pe, passando pelo cemiterio dos judeus, ate o Santuario de Dominus Flevit. Neste santuario, tivemos a santa missa. Frei Joao nos motivou, com propriedade, para o sentido dos varios sofrimentos da existencia humana, relacionados aos aspectos fisicos, morais, afetivos, espirituais e psicologicos. Isso tudo para nos recordar o quanto Jesus chorou sobre Jerusalem, que nao se converteu a sua mensagem.

Descendo ainda mais, chegamos ate o Santuario da Assuncao de Maria aos ceus, onde enfrentamos uma longa fila para tocar o seu tumulo. Depois, fomos ate a porta de Jaffa para o nosso gostoso almoco na Casa Nova (cardapio italiano). A seguir, visitamos o lindo Santuario do Getsemani, onde Jesus suou sangue naquela noite derradeira de sua paixao. O frade nos permitiu entrar no recinto perto do altar, onde resamos bastante e tiramos lindas fotos. E para terminar a nossa jornada de peregrinos, passamos ainda alguns momentos em oracao e meditacao na Gruta da Traicao, que faz a memoria do local onde Judas entregou o Mestre aos soldados romanos.

Na parte da noite, ficou livre para atividades pessoais, especialmente para assistir os jogos da Copa do Mundo, regados a suco de cevada! O grupo forma uma verdadeira familia espiritual.