sábado, 28 de agosto de 2010

Diferença entre Convento e Mosteiro


Frei Ivo: Sempre tive a curiosidade de saber qual a diferença entre Convento e Mosteiro. Por que vocês são freis e os do São Bento são monges? Agradeço a atenção (Lygia).

Antes de entrar numa resposta objetiva, vamos percorrer um pouco os trilhos da vida religiosa consagrada.

A vida religiosa nasceu, cresceu e se desenvolveu do húmus do Evangelho. Os três fundadores das Ordens religiosas anteriores a São Francisco (São Basílio, Santo Agostinho e São Bento) foram os organizadores deste modo de vida em comunidade. Eles coordenaram a experiência religiosa dos seus primeiros seguidores, à serviço da Igreja na pregação, educação, assistência aos doentes, vida de oração e penitência, estruturando essa experiência num contexto eclesial organizado e institucionalizado em fraternidades. Assim, nascem as instituições de religião, denominadas: instituição de religião eremítica (São Basílio); instituição de religião canonical (Santo Agostinho); instituição de religião monástica (São Bento); e mais tarde, a instituição de religião apostólica (São Francisco de Assis).

A instituição eremítica caracteriza-se pelo abandono do mundo, para viver somente para Deus e por Deus. Porém a vivência eremítica não é total. Nessa instituição, os seus membros vivem momentos de afastamento (solidão) e momentos comunitários (laura + cenóbio). A laura expressa a forma de vida dos que passavam a maior parte do tempo nas grutas, em meditação, contemplação, vida de jejum a pão e água, penitência e artesanato. O cenóbio expressa a forma de vida comunitária, ao redor do mosteiro. Significa que os monges passavam durante a semana nas grutas e no sábado, voltavam ao cenóbio para celebrar a liturgia, o encontro fraterno e reabastecerem-se de material necessário ao artesanato, pão e água para mais uma semana vivida nas grutas e cavas do deserto. Ainda hoje encontramos eremitérios neste estilo de vida, sobretudo na Palestina, na Grécia e em outros locais, onde os monges vivem parte do tempo em grutas e parte do tempo em comunidade.

A instituição canonical sistematiza-se pelo seu estilo clerical, sendo religiosos presbíteros, dedicados aos trabalhos apostólicos. Exemplo disso são os canônicos de Santo Agostinho.

A instituição monástica evidencia-se pela renúncia da família por causa de Cristo. Em compensação, a oferta da ajuda fraterna faz com que os seus membros dediquem-se em ser dom aos irmãos. Sustentar a fragilidade dos irmãos do mosteiro é desafio constante. Toda a responsabilidade na condução deste modo de vida recai sobre o Abade. Os seus membros ao professarem os votos, destinam seus bens ao próprio mosteiro. A pregação, por sua vez, somente é possível com o mandato do Abade. O monge que recebe esse mandato, permanece como monge, mesmo tendo recebido uma missão temporária no meio do povo de Deus. Exemplo disso podemos encontrar nos monges beneditinos.

A instituição apostólica tornou-se uma novidade no cenário das instituições tradicionais na época medieval. Francisco de Assis era uma pessoa muito simples, despreocupado com a vida organizada em mosteiros ou outras estruturas de seu tempo. A sua pretensão era formar uma fraternidade, composta de Frades Menores, tanto leigos, quanto clérigos. Existiam outras estruturas, bem organizadas, que favoreciam todas as condições para alguém que quisesse ser religioso, tais como a estrutura eremítica, canonical ou monástica. A estrutura monástica, por exemplo, já era configurada na história da Igreja por vários séculos, com a sua famosa stabilitas loci, favorecendo um programa estável de habitação, louvor a Deus e trabalho (ora et labora). Os monges entravam no mosteiro e recebiam todo o conforto necessário ao seu bem temporal e espiritual, sempre sob o regime estável de governo do abade. Neste estilo de vida não faltava nada ao candidato. Além do mais, já era devidamente reconhecida a sua estrutura jurídico-canônica, sem correr o risco de caminhar paralelamente à comunhão eclesiástica, em confronto com os movimentos heréticos da época. Francisco não entrou numa destas estruturas do seu tempo, porque não se encontrou naquele ideal de vida, fechado, enclausurado. Inspirado por Deus, preferiu seguir um estilo de vida itinerante, que fosse além das muralhas de Assis, além dos confins de uma diocese ou de um mosteiro medieval. Indo a Roma, recebeu a aprovação da Igreja, acontecendo assim a fundação da Ordem dos Frades Menores.

Os ramos femininos da vida religiosa consagrada brotam do desmembramento destas instituições, formando assim as ordens ou congregações contemplativas ou apostólicas, de acordo com a tradição do seu fundador ou nas novas propostas, reconhecidas e aprovadas pela Igreja.

Voltando agora à questão apresentada pela internauta, podemos dizer que o termo Convento, do latim conventus, significa "assembleia". Esta denominação surgiu na época dos romanos, significando assim assembleia romana onde os cidadãos se congregavam para fins administrativos ou de justiça.
O Convento é confundido, muitas vezes, com Mosteiro. No passado, o Convento era edificado na zona urbana da cidade, normalmente delimitada por uma muralha. Já o Mosteiro era o oposto, sendo edificado fora da cidade, geralmente em montanhas ou encontas de desertos rochosos. Hoje, tanto o Convento, quanto o Mosteiro se confundem, porque a cidade cresceu ao seu redor. Exemplo disso é o Mosteiro de São Bento no Rio de Janeiro e em São Paulo.

A raiz inicial da diferença entre Convento e Mosteiro está relacionada com a sua fundação, ou seja, os frades vivem desde o início em Convento e os monges, vivem em Mosteiro. No Convento, os frades se reúnem temporiariamente para a vida fraterna em comum (oração, partilha dos trabalhos internos e externos, momentos de recreação). Vivem em modo diferenciado dos monges, porque a vida dentro do recinto do Convento é passageira, uma vez que a missão dos frades é itinerante. Já os monges vivem na estabilidade quase absoluta dentro de um Mosteiro. No Convento existem frades (freis) não ordenados ordenados (irmãos) e frades ordenados. Cada um segue a vocação a um chamado, seja para os ministérios não ordenados, seja para os ministérios ordenados. No Mosteiro encontramos a mesma configuração, relacionada ao sacramento da ordem ou não, ou seja, existem monges irmãos e monges sacerdotes. O guardião é o superior do Convento. O abade é o superior do Mosteiro.

Em resumo, tanto no estilo itinerante (Convento), quanto no estilo monástico (Mosteiro), ambos bebem da mesma fonte do Evangelho, vivendo na consagração de suas vidas, de acordo com o carisma de seu fundador.

sábado, 21 de agosto de 2010

É possível anular um batismo feito na Igreja católica?


Prezado Frei, preciso anular meu batizado, que foi um sonho realizado há 4 anos atrás. Tenho 34 anos e a madrinha que escolhi se esconde através da igreja, uma vez que sempre seguiu outra religião inaceitável para mim, além de só enaltecer o mal e os "sacrifícios". Preciso anular esse batizado para viver em paz, pois carrego este peso e estou depressiva em função disso. Preciso tirar esse vínculo da minha vida. Por favor, me ajude, me oriente! O que faço? Poderei fazer catecumenato novamente para outro batismo? Quais são as minhas chances de anular este batismo?

O batismo na água e no Espírito Santo é a porta de entrada e o fundamento de todos os sacramentos da Igreja. O batismo pela água, ou ao menos pelo desejo, é necessário à salvação (Jo 3, 5; Mc 16,16). O batismo de desejo compreende também o martírio (batismo de sangue, cf. MT 10, 32; 16, 25). Liberta o ser humano de todos os seus pecados, inclusive do pecado original. Regenera espiritualmente o ser humano e lhe constitui filho de Deus, através da Graça (Rm 8, 15; 2Pd 1, 4).

Do ponto de vista teológico-jurídico, os sacramentos são direitos de um povo que é sacerdotal pela própria natureza (cânon 835). Resulta daí que todos os fiéis cristãos participam, cada um no exercício que lhe é peculiar, do múnus de ensinar, santificar e reger da Igreja. Pelo batismo, que é o portal dos demais sacramentos, todos integram o sacerdócio comum de Cristo. Nessa perspectiva, o fiel cristão é inserido nesse sacerdócio e por conseguinte, passa a ser sujeito de direito fundamental aos demais sacramentos, instituídos por Cristo e organizados pela Igreja.

O Código de Direito Canônico é taxativo, quando afirma que “os ministros sagrados não podem negar os sacramentos àqueles que os pedirem oportunamente, que estiverem devidamente dispostos e que pelo direito não forem proibidos de os receber”(cânon 843, § 1). Em outras palavras, é uma obrigação (dever) dos ministros sagrados, que corresponde a um direito da parte dos fiéis cristãos. A obrigação, por outro lado, é um dever de justiça, sobretudo aos ministros encarregados na cura de uma comunidade.

Configurando a questão apresentada pela internauta, o Código da Igreja afirma o seguinte:
“§ 1. Para que uma criança seja licitamente batizada, é necessário que: 1° - os pais, ou ao menos um deles ou quem legitimamente faz as suas vezes, consintam; 2° - haja fundada esperança de que será educada na religião católica; se essa esperança faltar de todo, o batismo seja adiado segundo as prescrições do direito particular, avisando-se aos pais sobre o motivo. § 2. Em perigo de morte, a criança filha de pais católicos, e mesmo não-católicos, é licitamente batizada mesmo contra a vontade dos pais” (Cânon 868).

Como se percebe no presente texto, deve haver o consentimento dos pais, ou dos responsáveis pela criança, para que ela seja batizada na Igreja. Contudo, a norma não limita a questão aos dois genitores da criança. O texto afirma que podem ser os pais, ou ao menos um deles... Significa que prevalece o direito ao batismo, mesmo que uma parte não concorde com o mesmo.

Em relação aos padrinhos do batizado, o cânon 874 do nosso Código apresenta os seguintes requisitos:
1) Que sejam idôneos para exercer essa função;
2) Que sejam designados pelo próprio batizando, pelos pais, pelo pároco ou pelo ministro;
3) Que tenham 16 anos de idade completos;
4) Que sejam católicos, já crismados e tenham feito a primeira Eucaristia;
5) Que não sejam passivos de penas canônicas;
6) Que não sejam o pai ou a mãe do batizando.

É importante recordar que o Código admite “um só padrinho ou uma só madrinha, ou também um padrinho e uma madrinha”(cânon 873). Em base a esse cânon, onde a realidade ecumênica for possível, se pode, por exemplo, colocar um padrinho católico e um padrinho de outra religião cristã, desde que concorde com a parte católica, sem o prejuízo da educação na fé do batizando. Nesse caso, a parte acatólica não é um verdadeiro padrinho, mas funciona como testemunha do batizado.

Na praxe pastoral, acontecem casos como esse em que os pais ou os próprios batizados estão arrependidos com os padrinhos. Daí, perguntam: - Frei, a gente pode anular, ou arranjar outros padrinhos? Infelizmente, a resposta é negativa. O cânon 872 deixa aberta a possibilidade de não haver padrinhos, quando diz que: “Ao batizando, enquanto possível, seja dado um padrinho, a quem cabe acompanhar o batizando adulto na iniciação cristã e, junto com os pais, apresentar ao batismo o batizando criança”.

Os padrinhos, se convidados, podem ajudar no cumprimento das obrigações essenciais do batizado. Porém, não lhes são essenciais. Além do mais, na maioria das vezes os padrinhos são uma espécie de arranjo, um status social, para dar presentes ao batizando e para cumprir ou devolver favores entre as famílias. Do ponto de vista da ajuda no cumprimento das obrigações cristãs, pouco ou quase nada fazem. E por último, seria ridículo ter que fazer outra celebração (re-batismo) e, sem contar, que os nomes dos padrinhos, se houver, já estão registrados no Livro de batismos e não podem ser cancelados.

Voltando ao caso, de acordo com o cânon 845, § 1, os sacramentos do batismo, confirmação e ordem, já que imprimem caráter, não podem ser repetidos, porque revestem o ser humano de Cristo (Gl 3, 27), tornando-o membro de seu Corpo (1Cor 12, 12-13), constituindo-o em Povo de Deus.

Em base ao exposto, conclui-se que o batismo imprime caráter e, por isso, não pode ser repetido, salvo restando se foi inválido pela própria natureza (batismo realizado numa Igreja não aceita pela Igreja Católica). A responsabilidade do batismo de crianças recai sobre os pais ou responsáveis pelas mesmas. Mesmo que haja o consentimento somente de um dos genitores, o batismo seja administrado e não pode ser cancelado. Também não se pode anular os padrinhos, ou um deles, uma vez que o Código admite a possibilidade de não convidá-los. Porém, uma vez convidados, enquanto testemunhas do ato e enquanto corresponsáveis em tutelar a fé da criança batizada, a resposta da Igreja é: nem o batismo válido pode ser deletado, nem os padrinhos.

Aconselhamos a internauta a trabalhar melhor a sua fé, para que o seu batismo seja fecundo e continue produzindo o seu efeito, não obstante a sua negação e a dos padrinhos. E que o Espírito do Senhor a ajude a contornar esta situação em busca de melhores dias, pelo perdão e pela misericórdia de Deus diante de pessoas que nem sempre cumprem a sua função no testemunho da fé, esperança e caridade.

sábado, 14 de agosto de 2010

Diferença entre paróquia e santuário


Sou um pároco bastante jovem. Atuo numa paróquia que fica a um quilômetro da catedral. Esta paróquia, pelo fato de haver uma boa presença de religiosos consagrados, tradicionalmente atende quase todas as confissões de uma cidade de quase 250 mil habitantes. Inclusive o pároco da catedral e os párocos das outras paróquias remetem seus paroquianos para a nossa paróquia, porque sabem que sempre tem turnos de confissões. Além disso, muita gente que frequenta a nossa paróquia vem de longe, porque se sente atraída pela devoção popular ao seu padroeiro e também pelo bom serviço religioso, voltado ao atendimento dos fiéis, não só nas confissões, mas também nas suas várias celebrações, como se fosse um santuário. Daí eu pergunto: não seria melhor transformá-la em santuário, em vez de paróquia? E quais seriam os passos, para que isso pudesse acontecer oficialmente na Igreja?

A inquietação apresentada pelo jovem pároco faz parte do cenário de muitas paróquias do Brasil, que poderiam tranquilamente passar ao status de Santuário. Mas antes de dar a resposta, vamos dar uma rápida revoada pelas diferenças que existem entre os dois institutos jurídicos.

1. A configuração da paróquia no cenário da Igreja

Nos primeiros séculos da era cristã, existiam somente as Catedrais, onde o povo se congregava ao redor do seu bispo e dos seus presbíteros nas celebrações. Porém, na medida em que se expandia a missão da Igreja, foram organizadas as paróquias, como porções do Povo de Deus, um tanto distantes das Catedrais, mas em comunhão com o Bispo. Esta configuração de paróquia ainda era escassa no cenário da Igreja. A partir de 1150, fruto do confronto entre ricos proprietários, nobres, que pretendiam haver o domínio da Igreja em mãos, a Igreja viu-se na necessidade de organizar a vida do Povo de Deus em pequenas porções do rebanho de Cristo. Também, percebeu-se na necessidade de confiar essa porção aos cuidados de um pastor, chamado, na época, de vigário. Os vigários eram nomeados pelos Bispos e não pelos fazendeiros. Assim, a paróquia surgiu como alternativa aos grandes centros (catedrais). Em cada sítio ou povoado havia uma paróquia, com média de 500 habitantes (fiéis cristãos católicos). O vigário era o seu encarregado, também chamado de cura d’almas. Ele tinha a incumbência de cuidar para que essa porção do Povo de Deus pudesse ser evangelizada, sobretudo na questão da vida religiosa de seus habitantes.
O Concílio Lateranense IV (1215) determinava que cada cristão devia confessar-se e comungar na sua própria paróquia, ao menos uma vez por ano. Somente o vigário (pároco) podia administrar o batismo e assistir o matrimônio.
A partir do Concílio Vaticano II, a paróquia ganhou autonomia. O pároco não é simplesmente um vigário do Bispo, mas é o pastor próprio da paróquia a ele confiada, sob a autoridade do Bispo (can. 519). A paróquia legitimamente erigida tem personalidade jurídica pelo próprio direito (can. 515, § 3). O pároco é o seu legítimo representante, nomeado pelo Bispo, por um tempo determinado (can. 522). A CNBB (Conferência dos Bispos do Brasil) determina que o Bispo diocesano nomeie os párocos por um período não inferior a seis anos.
A organização paroquial é territorial, por uma simples questão de tradição. No entanto, o novo Código permite a organização de paróquias pessoais, segundo a necessidade de ritos, língua, nacionalidade ou outras razões (can. 518).

2. A configuração do santuário no cenário da Igreja

O santuário, do latim sanctuarium, é o lugar para onde afluem peregrinos e romeiros, atraídos pela veneração do santo que é cultuado naquele recinto. É o lugar da presença de Deus, a ponto de ser denominado na Bíblia como santíssimo (Lv 16,16), tendo no seu interior uma parte reservada ao tabernáculo, como foi no templo de Jerusalém.
No Direito da Igreja, o santuário é denominado como igreja ou lugar sagrado, ao qual afluem em grande número, por algum motivo especial de piedade, os peregrinos (can. 1230). A motivação pode ser uma imagem, uma relíquia ou um milagre acontecido no local em modo sobrenatural. Exemplos disso podemos perceber aqui no Brasil, no Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, de Madre (Santa) Paulina. ou de outros santuários que se tornaram lugares de culto pelo seu imemorável costume.
Os santuários podem ser diocesanos, se houve a aprovação do Bispo; nacionais, se houve a aprovação da Conferência Episcopal; internacionais, se houve a aprovação da Santa Sé (can. 1231). A sua finalidade, autonomia, domínio e administração dos bens temporais são determinados nos estatutos, que devem ser aprovados pela respectiva autoridade competente da Igreja (can. 1232, § 1). Já a personalidade jurídica, depende sempre das circunstâncias locais, de acordo com o direito próprio de cada santuário. Exemplo: um santuário pertentencente a um instituto de vida consagrada ou sociedade de vida apostólica, tem a sua personalidade jurídica autônoma ou pode ter a sua personalidade jurídica desmembrada no próprio instituto. Do mesmo modo a nomeação ou designação do seu reitor, depende sempre do que rezam os seus estatutos.
Há uma ressalva sobre a questão do decreto, que nem sempre existe. Há santuários que se consolidaram pela sua tradição, mediante a afluência centenária ou imemorial dos peregrinos ao local (can. 26). Assim, desde que não seja contrário ao direito divino (can. 24, § 1), um santuário pode adquirir o seu status de aprovação pelo próprio costume. Exemplo disso é o Convento Santo Antônio do Rio de Janeiro, que é considerado santuário desde há mais de 400 anos, não obstante careça de um decreto de ereção a santuário.
É interessante recordar ainda que o Código de Direito Canônico dá grande importância ao santuário, como local privilegiado da prática e devoção religiosa popular. Daí a importância de bem organizar a ação evangelizadora dentro do mesmo, usando como meios privilegiados a pregação da palavra de Deus, de uma fecunda vida litúrgica, mediante a Eucaristia, a Penitência e outras formas de piedade (can. 1234). A celebração penitencial, por exemplo, deve ser proporcionada a todos aqueles que a procuram, como reconciliação profunda com Deus e com a Igreja. O Papa João Paulo II, numa de suas homilias dirigidas aos reitores de santuários (22 de janeiro de 1981), afirmava: “Acima de tudo, que toda a vida dos santuários favoreça, do melhor modo possível, a prece pessoal e comunitária, a alegria e o recolhimento, a escuta e a meditação da palavra de Deus, a celebração verdadeiramente digna da Eucaristia e a recepção pessoal do sacramento da Reconciliação”.

3. Diferenças entre paróquia e santuário

Do ponto de vista jurídico, ambos os institutos necessitam da aprovação da autoridade competente da Igreja para a sua ereção, salvo restando que a ereção do santuário seja tradicionalmente aceita como centenária ou imemorial.
Em relação às diferenças específicas, podemos elencar as seguintes:
1) A paróquia é o lugar onde os fiéis frequentam e se associam, através do dízimo ou outra forma de manutenção. O santuário vive, sobretudo, das intenções de missas, das esmolas e das doações depositadas em seus cofres;
2) A paróquia necessita de uma estrutura colegiada para o seu gerenciamento, tais, como os conselho pastoral paroquial e comunitário, o conselho econômico, a estruturação das várias pastorais e movimentos, onde o pároco e os vigários ocupam grande parte do tempo para o seu gerenciamento com uma agenda cheia de compromissos, que praticamente os impedem ao atendimento das confissões, aconselhamentos, visitas, bênçãos. O santuário, por estar livre destas estruturas, dedica todo o seu tempo para as celebrações eucarísticas, confissões, bênçãos, atendimento personalizado e até para algumas visitas domiciliares aos fiéis;
3) A paróquia tem uma forte estrutura voltada aos sacramentos, com cursos preparatórios, livros de registros e celebrações. O santuário, mesmo que acolha algumas celebrações, próprias de uma paróquia, como um batismo ou um matrimônio, basta que exija a documentação transferida da paróquia e a devolva, depois de celebrados os devidos sacramentos;
4) A paróquia está atrelada às reuniões da diocese, bem como às taxas que são estipuladas pela mitra diocesana. O santuário tem mais tempo para o atendimento de seus fiéis, salvo restando o tempo dedicado nos eventos comuns da diocese e das contribuições que eventualmente são solicitadas pelo ordinário local;
5) O povo que frequenta a paróquia, embora pudesse haver paróquias pessoais, ainda é um povo muito local, que normalmente reside em seus entornos. Já o santuário, acolhe peregrinos e romeiros de longe e de perto, que via de regra, são itinerantes no local. Por isso, no santuário, dificilmente se pode instaurar uma pastoral de continuidade, à diferença do público alvo de uma paróquia.

Em base ao exposto, tendo como motivação o caso em tela, mirando o bem maior que se possa oferecer ao povo de Deus, um local que tenha vocação de santuário poderia perfeitamente ser transformado em santuário. Eis os encaminhamentos a serem dados:
1) Discutir antes com a comunidade local, se isso seria conveniente, consultando a assembléia paroquial;
2) Se o parecer for favorável, solicitar do Superior competente (ordinário do religioso) a aprovação da ereção da paróquia em santuário, anexando no pedido as devidas motivações;
3) Se o parecer do ordinário próprio e do seu conselho for favorável, o próprio Superior deve levar a questão até o bispo, solicitando-lhe a aprovação, bem como o seu decreto de ereção em santuário.

E que assim os religiosos, diante do seu dedicado e peculiar serviço à ação evangelizadora da Igreja, possam ser respaldados pela aprovação da autoridade competente, transformando a paróquia em santuário.