sexta-feira, 28 de outubro de 2011

The Elders no Convento Santo Antônio





The Elders (“os Sábios”, “os Anciãos”) é um grupo independente de líderes globais reconhecidos, criado por Nelson Mandela, que oferece sua experiência e influência coletiva com o objetivo de promover a paz, enfrentar as principais causas de sofrimento humano e promover os interesses compartilhados da humanidade. O grupo é composto por Marti Ahtisaari, Kofi Annan, Ela Bhatt, Lakhdar Brahimi, Gro Brundtland, Fernando Henrique Cardoso, Jimmy Carter, Graça Machel, Mary Robinson e Desmond Tutu.

Duas vezes por ano, alguns dos Elders se reúnem com jovens de diferentes países para trocar experiências. Neste ano, o grupo escolheu o Convento Santo Antônio para a realização deste evento, que aconteceu no dia 26 de outubro p.p. , sendo patrocinado pelo Grupo ABC, do empresário Nisan Guanaes.
Nessa edição, houve a participação de 48 jovens, de diversos estados brasileiros. O grupo dos jovens chegou aí pelas 15h00 e iniciou o seu programa, com uma visita pela Igreja de São Francisco da Penitência (VOT), seguindo a visita à nossa Igreja (em restauro) e ao claustro do Convento, com suas várias capelas já restauradas e em fase de conclusão do restauro. Às 16h15 chegaram os Elders, que tiveram a sua abertura no claustro do Convento, presidida pelo Arcebispo Desmond Tutu e pelo Presidente FHC. Na sequencia, os jovens e os Elders foram para as mesas redondas, montadas nos corredores do claustro para um debate que versou sobre os temas: “meio-ambiente e desenvolvimento sustentável”, “o papel da mulher na sociedade”, “construção de um Brasil mais justo: questões raciais e multiculturais” e “combate à violência: o papel do governo e da sociedade”. Às 18h00, houve o plenário no Refeitório do Convento, onde os jovens e Elders apresentaram suas conclusões sobre as temáticas supracitadas, seguido de um pequeno concerto em piano e um coquetel no claustro.
Como resultado final, todos saíram contentes, ao constatar que mesmo no meio das ruínas do restauro, é possível a gente organizar a casa, receber hóspedes e eventos, bem como compartilhar o que pensam os anciãos e jovens de nossa época sobre temas desta envergadura.

sábado, 15 de outubro de 2011

Casais em Segunda União podem ser padrinhos de Batismo?


Beatriz é batizada na Igreja católica, crismada e com primeira Eucaristia. Casou-se na Igreja e por vários motivos, não conseguiu levar adiante o seu matrimônio. Foi abandonada pelo exposo, tendo que cuidar de dois filhos, que por sinal são católicos praticantes. Dez anos depois, Beatriz conheceu Teobaldo, homem livre, também católico praticante. Depois de alguns encontros, resolveram se unir e hoje são casais em Segunda União, frequentadores inclusive da Pastoral Familiar da diocese. Porém, ao serem convidados para serem padrinhos de um batizando,surgiu a dúvida. A secretária da paróquia pergunta, então, se o Direito da Igreja permite que estas pessoas sejam padrinhos ou madrinhas?

1. Casais em Segunda União
1. No cenário atual da Igreja é muito frequente a presença dos Casais em Segunda União, inclusive contemplados nas orientações oficiais da Igreja (Guia de Orientação para os Casos Especiais, CNBB, Brasília, 2005, p. 30-43; 64-69).

2. Do ponto de vista jurídico, a Segunda União acontece quando um casal recebeu o sacramento do matrimônio, mas por uma série de motivos, separou-se e divorciou-se e uniu-se a uma outra pessoa.

3. Do ponto de vista da pastoral, os elementos que constituem uma Segunda União são o firme propósito de formar uma nova e séria união, responsável e aberta para a vida e estabilidade do casal, isto é, um estado permanente.

4. A Igreja lança um olhar carinhoso para esses casais, tendo como perspectiva a misericórdia e a compaixão, de acordo com a Parábola do Bom Samaritano, que diante daquele homem caído à beira da estrada, volveu para ele o seu olhar misericordioso e cuidou dele (cf. Lucas 10,25-37). Segundo o Padre Luciano Scampini, “eles podem ser ramos verdes dentro da Igreja”. Sendo ramos verdes, podem exercer praticamente todos os ministérios nas pastorais e movimentos da Igreja. Aliás, a própria comunidade deve ser trabalhada, para que haja a acolhida e a inclusão desses casais na ação evangelizadora da Igreja. Assim, não haveria tanta discriminação nos meios eclesiais, como sói acontecer em muitas comunidades. Se Deus pudesse contar apenas com as pessoas santas, haveria poucas pessoas na missão eclesial nos dias de hoje. Recordemos que os outros também são pecadores e nem por isso deixam de ser investidos para os ministérios eclesiais. Os Casais em Segunda União podem muito bem serem chamados a integrar a Pastoral Familiar, a Pastoral da Saúde, a Pastoral do Dízimo, o Apostolado da Oração, o Ministério da Música, a Coordenação da Comunidade, ao Conselho Comunitário e tantos outros serviços ou ministérios organizados dentro da comunidade. A rigor, o único ministério que não poderiam assumir é o de Ministro Extraordinário da Comunhão Eucarística, pelo fato de não poderem aceder à Comunhão na Igreja.

2. Os padrinhos de Batismo
1. Ao garimpar a temática na história da Igreja, chegamos à conclusão que a origem dos padrinhos de Batismo existe desde os primeiros tempos do cristianismo, quando os pagãos se convertiam e recebiam o Batismo, e, com ele, a vida espiritual. Eram também denominados de pais espirituais, porque cuidavam da formação espiritual de seus afilhados. Além do mais, em época de guerra, poderiam substituir os genitores na dura tarefa de educar os filhos na fé cristã. No caso de neófitos (adultos recentemente convertidos a Cristo pelo batismo), os pais espirituais exerciam um preponderante papel no acompanhamento prático da doutrina católica. Isso era tão sério que chegavam a ser, na maioria das vezes, os mesmos padrinhos na Confirmação (Crisma).

2. Em relação aos critérios da Igreja para a escolha de padrinhos e madrinhas, a Introdução Geral do Ritual do Batismo de Crianças, n◦ 10, diz: “O padrinho e a madrinha tenham maturidade para desempenharem esse oficio; estejam iniciados nos três sacramentos da iniciação cristã, do Batismo, da Crisma e da Eucaristia; pertençam à Igreja Católica e pelo Direito não estejam impedidos de exercer tal oficio”.

3. O Código de Direito Canônico diz que: “Ao batizado, enquanto possível, seja dado um padrinho, a quem cabe acompanhar o batizando adulto na iniciação cristã e, junto com os pais, apresentar ao Batismo o batizando criança. Cabe tam¬bém a ele ajudar que o batizado leve uma vida de acordo com o Batismo e cumpra com fidelidade as obrigações inerentes”(cânon 872). Também é possível apenas um só padrinho ou uma só madrinha ou também um padrinho e uma madrinha (cânon 873). Em outras palavras, a escolha do padrinho é facultativa. Embora a maioria absoluta elege dois padrinhos (casal). Seria perfeitamente possível, pelas normas da Igreja, apenas um padrinho ou uma madrinha.

4. No que tange aos requisitos na escolha, o padrinho e a madrinha devem: 1) ser designado pelo próprio batizando ou pelos seus pais, tendo a intenção de cumprir esse encargo; 2) ter ao menos 16 anos de idade, ser católicos, confirmados (ou crismados), tendo recebido o sacramento da eucaristia e levar vida de acordo com a fé e o encargo que vai assumir; 4) ser isento de penas canônicas legitimamente irrogadas ou declaradas; 5) não ser pai ou mãe do batizando (cânon 874).

5. Ao aplicar o Direito Universal da Igreja ao caso em epígrafe, não encontramos em todo o Código nenhuma norma explícita, que pudesse desabonar um Casal em Segunda união de ser padrinho e madrinha de um batizado.

6. Algumas dioceses do Brasil colocam em seus Direito Próprio (normas diocesanos) a proibição de quem vive numa união irregular para ser padrinho ou madrinha de Batismo, como seria o caso, de um Casal em Segunda União. Porém, a maioria das dioceses não vê problema nisso, avaliando apenas se os padrinhos fizeram o curso e se não pertencem a outras denominações religiosas. Também, quase ninguém se pergunta, se os padrinhos eleitos já fizeram a crisma e a primeira Eucaristia.

3. Uma possível resposta ao fato em tela
1. Do ponto de vista jurídico, não existe pré-requisito que impeça os pais ou adotantes do filho ou adotado, de o batizarem na Igreja. Ora, se a sua função em ensinar, santificar e reger a vida de seu filho ou adotado é mais importante que a função dos padrinhos, não vemos aqui causa suficiente para impedir um casal de Segunda União de ser padrinho ou madrinha de batizandos;

2. O Direito Canônico é maior do que o Direito Próprio de uma diocese e, embora ela tenha a liberdade de promulgar normas para a boa conduta de seus fiéis, tais normas não deveriam ser contrárias ao Direito Universal. Aqui, a única brecha encontrada por alguns bispos, seria a margem de interpretação que os requisitos do cânon 874 deixam. Contudo, não vemos que aqui se possa equiparar o caso concreto a uma pena canônica legitimamente irrogada ou declarada (veja os cânones: 1318, 1319, 1336, 1346).

3. A missão da Igreja, respirando em dois pulmões (pulmão do direito + pulmão da pastoral), deveria estar voltada sempre para a linha da inclusão e não da exclusão das pessoas para assumirem certos ministérios, desde que um não seja contrário ao outro.

Portanto, neste caso, não encontramos, nem no Direito Universal da Igreja, nem na sua missão evangelizadora, critérios objetivos que possam desabonar estes casais de serem padrinhos de Batismo ou de Crisma na Igreja. E se houver proibição dentro de uma diocese, outras dioceses podem estar de portas abertas para que esses fiéis possam ser acolhidos e cumprirem a sua missão de padrinhos e madrinhas.

sábado, 1 de outubro de 2011

Ex religioso faz greve de fome e quer seus bens de volta


Fabrício, com 50 anos de idade, encanta-se pela vida religiosa consagrada e deseja ser frade menor. Faz alguns encontros de preparação vocacional e a seguir, as etapas preparatórias ao noviciado (tempo de prova). Antes de sua primeira profissão, motivado pelo espírito de pobreza, doa à fraternidade um caminhão, algumas caixas de ferramentas (era mecânico) e uma pequena soma em dinheiro. Segue o itinerário de seus estudos filosóficos e, quando pensa que estava maduro para fazer a sua profissão perpétua, não é aprovado pelo corpo de formadores e nem pelo conselho da Província. É transferido para outra fraternidade, onde não se encaixa na mesma, por motivos de contínua insatisfação com os princípios da vida religiosa consagrada. Tem sérios conflitos com a fraternidade e acaba sendo dispensado da vida religiosa consagrada, enquanto professo temporário. Tenta entrar em outra Província, mas não é aceito. Então, resolve processar a Província onde entrou, alegando que lhe doou os seus bens, que trabalhou nela e nada recebeu pelos serviços prestados. A sua demanda é julgada como improcedente. Porém, insatisfeito diante disso, inicia uma greve de fome, distribuindo inclusive um manifesto contra a Província, onde alega que foi dispensado e dela nada recebeu. Também alega uma ação na justiça por falsidade ideológica, dano moral e responsabiliza a Província por danos à sua saúde, caso não seja atendido em seus anseios.

A resposta à questão em tela será impostada nas normas da Igreja (Direito Canônico), com alguns acenos ao Direito Civil.

1. A espinhosa questão dos bens temporais de todo e qualquer cidadão cristão, sobretudo católico, entra na esfera dos conselhos evangélicos, especialmente no voto de pobreza. Tal voto emerge do princípio fundamental da vida religiosa consagrada, que é a renúncia de tudo aquilo que cria obstáculos ao seguimento de Cristo pobre e crucificado. Na tentativa de seguir as suas pegadas, a vida consagrada formatou os conselhos evangélicos, na exigência e obrigação dos votos. Para seguir o exemplo de Cristo e seus seguidores, o religioso consagrado aceita essa proposta, que requer dele também a renúncia à posse dos bens temporais.

2. O primeiro parágrafo do cânon 668 reza que o “os noviços, antes da primeira profissão, cedam a administração de seus bens a quem preferirem”. Essa exortação se faz necessária, para que o noviço possa, na sua plena liberdade interior, liberar-se de todas as propriedades e posses de bens temporais, sobretudo no que concerne à sua administração. O tempo de noviciado é um estágio inicial, tendo em vista a futura profissão perpétua. Para tanto, é um treinamento em vista do compromisso posterior. No entanto, não significa que o noviço esteja renunciando a esses bens. A Igreja é muito prudente, tendo em vista a experiência cristalizada em todos os tempos, que muitos noviços desistem da vida consagrada, e ao sair do instituto, possam continuar em plena posse de tais bens. Portanto, não está em questão a renúncia dos bens patrimoniais, mas a cessão da administração dos mesmos, que permanecem com pessoas de sua confiança até a renúncia definitiva desses bens.

3. É comum nos institutos de vida consagrada, solicitar do noviço um testamento por escrito, cujo documento ateste a cessão da administração de seus bens temporais a outrem. A administração, em geral, é confiada aos membros de sua família: pais, irmãos, primos ou até a outras pessoas, quando o noviço não tem outra alternativa. Porém, o Código de Direito Canônico exorta, para esse testamento “seja válido também no direito civil”(can. 668, § 1).

4. O Código de Direito Civil legisla sobre três tipos de testamento, ou seja, o testamento público, o testamento cerrado e o testamento particular (Art. 1862). Salvo melhor juízo, a matéria em foco entra na normativa do testamento público, que para ser válido, deve ser escrito por tabelião e assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo tabelião”(Art. 1864). Em se tratando do seu caráter temporário (votos simples), não se recomenda aos institutos enfrentar toda essa burocracia no noviciado. Bastaria um atestado simples, assinado pelo testador, com firma registrada, e duas testemunhas. No entanto, diante da profissão perpétua de seus membros, todos deveriam fazê-lo, considerando a distância que há entre a legislação canônica e a legislação civil. Para o Estado, as coisas devem estar objetivamente documentadas e registradas em cartório, caso contrário, de nada valem.

5. O parágrafo quinto do cânon 668 afirma ainda que o religioso que renuncia plenamente a seus bens, renuncia também à capacidade de adquirir e de possuir tais bens. Essa renúncia é estipulada no testamento. A normativa se faz necessária, porque um religioso poderia muito bem renunciar aos bens temporais que possui no momento de sua profissão e não renunciar à capacidade futura. É o caso da herança, por exemplo, que ele poderia adquirir de um parente seu, posterior à profissão perpétua no instituto.

6. Outra questão que merece ser recordada é o trabalho efetivo do religioso dentro da instituição, sejam eles encarados como serviços domésticos, sejam eles em paróquias, creches, escolas, colégios, faculdades. Antes de tudo, faz-se mister distinguir se tal entidade é parte integrante da pessoa jurídica do religioso, ou outra entidade. Se o trabalho é configurado na esfera da entidade do religioso, ocorre verificar nesse caso se o seu estatuto social permite o pagamento, segundo as leis trabalhistas, aos seus membros. Se o direito próprio do instituto permite que o trabalho possa ser remunerado, o fruto da percepção entra no caixa comum da mantenedora. Caso contrário, o religioso não pode reivindicar direitos trabalhistas por seu serviço prestado.

7. Ao garimpar uma resposta diante da entidade de Fabrício, constatamos que o direito próprio da Província (Estatuto Social), reconhecido em Cartório, afirma que: Os sócios temporários, desde sua admissão na Província, deverão responder aos seguintes deveres: [...] reconhecer que o trabalho assistencial prestado é de exclusivo caráter voluntário, e por conseqüência, não há “animus” na prestação de serviços, inexistindo qualquer direito trabalhista (Estatutos Sociais, art. 11, IV). Em base a este dispositivo, o caso de Fabrício foi julgado em primeira instância, como improcedente.

8. A doação dos seus bens à Província poderia ter sido recusada. De fato, não se aconselha nenhuma entidade a receber bens, que porventura possam gerar expectativa de vínculo com a mesma, especialmente de um professo temporário. A primeira profissão religiosa é como se fosse um tempo de noivado, em que as partes ainda não deram uma a outra o seu consentimento. Porém, Fabrício era livre. Os seus bens poderiam ter sido doados, ou para seus familiares, ou para quem ele intencionasse naquele momento. Portanto, se foram doados à entidade religiosa, como doação sem reserva, isso não lhe garantiria que se não fosse aprovado para a entrada definitiva na Província, que pudesse reavê-los.

9. No nosso modo de entender, Fabrício não tem direito a reclamar ressarcimento, nem pelos serviços prestados, nem a continuar acusando a Província por falsidade ideológica, dano moral e ou danos à sua saúde. Na época de sua entrada para a vida religiosa consagrada, ele conhecia as regras de sua associação e, como sócio temporário, se não conseguiu cumpri-las, também não estava apto para ser sócio permanente da mesma. E se hoje ele resolve fazer greve de fome, não é a entidade religiosa que vai assumir os riscos de sua saúde, uma vez que ele não pertence mais à Província. Portanto, salvo melhor juízo, a melhor saída diante da situação seria um acordo, que previsse a devolução do valor equivalente aos bens da época, tendo em vista o entendimento possível entre as partes no melhor deslinde da questão.